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    Adoção segura e responsável: histórias que mudaram vidas
    Arquivo pessoal/ Romina Duque Porto
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    Há muitas formas de se viver a parentalidade, desde a gestação tradicional às possibilidades de inseminação artificial ou tratamentos ginecológicos. Apesar do desejo e da crença social que valoriza a gestação biológica como uma forma de conexão maior, a adoção é um importante caminho para que pessoas se tornem pais ou mães.

    No entanto, o trajeto nem sempre costuma ser percorrido na velocidade que os futuros pais desejam. São necessários o cumprimento de uma série de requisitos, uma espécie de garantia para atestar que a família está em plenas condições de adotar uma criança ou adolescente.

    “A gente vai ter uma vida muito feliz juntos, sabia?”

    Romina Porto, uma recifense com sotaque característico de Pernambuco, explica que a vontade de maternar surgiu ainda em 2015, embora o sonho só pudesse ser realizado poucos anos depois. Foi em 2019 quando decidiu que entraria no processo de adoção legal na cidade de Maceió. Mas os planos mudaram um pouco de rota com o início da pandemia da Covid-19, momento em que o isolamento físico passou a ser regra em todo o país.

    No entanto, “quando foi no final de maio de 2020, me ligaram”, explica Romina. Perguntaram-lhe: “como está o seu processo de adoção?”, ao que a advogada respondeu: “eu nem olhei, porque, no meio da pandemia, estava tudo interrompido”. Para sua surpresa, a resposta que veio em seguida foi: “chegou uma criança aqui com o seu perfil, o nome dele é João Gustavo e ele vai completar sete anos daqui a 12 dias”. 

    Não esperou por fotos, características físicas ou temperamento emocional. Sua resposta foi muito clara: “é meu filho”.  “No final do dia eu recebi uma foto dele e tinha muito medo que fosse uma criança branca porque eu sempre falei que queria adotar um filho que as pessoas costumam rejeitar”, enfatiza. 

    Devido às limitações da condição sanitária provocadas pela pandemia, o contato físico inicial foi curto e a relação entre Romina e João Gustavo dava os primeiros passos. Um momento de recomeço para ambos. O abraço, aconchego e o amor entre os dois viralizou nas redes sociais depois que a mãe compartilhou o vídeo do primeiro encontro. “A gente vai ter uma vida muito feliz juntos, sabia?”, verbalizou Romina para o Gu, como ela costuma chamá-lo.

    Foto: Arquivo pessoal/ Romina Duque Porto

    Foi tudo tão intenso, rápido e emocionante. Romina iniciava, naquele momento, os primeiros passos da maternidade, que além de solo, também era interracial. “Ele [João Gustavo] foi o combustível que eu precisei a vida toda para ter as conquistas que eu tenho hoje.”, explica Romina.

    “A pessoa que eu fui hoje não se parece minimamente com quem eu fui. Se você me perguntasse, antes da maternidade, quem sou eu, eu iria falar meu currículo, meu trabalho, e não quem sou de fato”, acrescenta. 

    As preocupações com a identidade, a autoestima e os riscos do preconceito fizeram com que Romina buscasse compreender as questões raciais no Brasil. “O jeito que eu lido com isso sempre foi de fortalecê-lo. Eu não gosto de uma postura que se acovarde. Eu preciso e ensino a ele que se defenda e que seja forte para enfrentar essas questões“, justifica. 

    Foto: Arquivo pessoal/ Romina Duque Porto

    Ao longo do crescimento do filho, Romina incentivou que o cabelo dele crescesse (antes, era raspado), apresentou personalidades pretas importantes e os dois até combinaram de fazer tranças afro juntos para mostrar a beleza do cabelo crespo. Eu fiquei muito orgulhosa porque, no início deste ano letivo, perguntaram o que ele mais achava bonito e respondeu: ‘a minha cor’“, relembra.

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    Edmar Oneda, que sempre sonhou em ser pai, havia crescido ainda em um contexto nacional de muita hostilidade e preconceito com pessoas LGBTQIAP+. Morador da cidade de São Paulo, decidiu fundar uma empresa no começo dos anos 2000 e destinar parte do lucro para entidades do terceiro setor, incluindo um abrigo de crianças na fila de espera para adoção.

    Apesar de sempre ter resistido se aproximar muito do local – sabia que isso impactaria o seu emocional -, Edmar decidiu que iria fazer algumas visitar recorrentes ou preparar ações comemorativas. Anos antes desse momento, o empresário havia sonhado que se tornaria pai de uma criança de aproximadamente seis anos e com cabelos encaracolados. Uma memória que decidiu guardar consigo.

    E é no meio das atividades no abrigo que Edmar se aproxima de Wallace, até então enérgico e com o rótulo de problemática, mas que criou com ele um certo laço emocional ao longo do tempo. Entre idas e vindas, mudanças e tentativas de contato com a família biológica, a criança finalmente estava disponível para adoção.

     As visitas se tornaram cada vez mais constantes, as conversas e o acompanhamento no desenvolvimento escolar do estudante também. Mas a persistência sempre foi a marca do empresário, que assumiu como missão ter o Wallace como filho.

    Contratei um advogado e consegui uma autorização para ficar com o meu filho por um mês, ainda durante o processo de adoção, desde que tivesse um assistente social acompanhando o processo”, explica.

    Edmar lembra que não foram poucos os julgamentos enfrentados durante o processo da adoção e Wallace. Primeiro porque ele era um homem gay, somado ao fato de que estava realizando a adoção solo, interracial e de uma criança com idade considerada avançada. Mas isso nunca foi um problema. O desejo, no final, era que os dois pudessem finalmente viver juntos como uma família e de forma legal ao fim de todos os trâmites judiciais.

    “O amor genuíno transforma as pessoas, embora elas queiram colocar rótulos em mim, de um homem gay, solteiro e pai. Não, eu sou só uma pessoa que desejava a paternidade e encontrei por esse caminho a forma de ter um filho“, enfatiza Edmar.

    Pelo fim dos rótulos em torno da adoção, o empresário busca evitar discursos e narrativas que transformam sua história pessoal em um ato de caridade ou, ainda mais, a diferenciação persistente na sociedade entre “filho adotivo” e “filho biológico”.  “Eu vejo nas famílias, ainda, essa história do filho adotivo. Eu tenho um filho. Por que preciso frisar que ele é adotivo?“, questiona. Edmar compreende que esse é um estereótipo que precisa ser superado, assim como o conceito de “filho do coração”, pois essa é uma expressão que diferencia e diminui a importância da relação da família com a criança ou jovem que passa pela adoção e que, portanto, se torna filho legítimo.

    A vida que tem hoje ao lado do filho Wallace foi uma escolha que surgiu a partir de seu propósito de vida. Ao contrário dos comentários que costuma ouvir das pessoas, o empresário destaca que o filho é fruto de uma vontade íntima. “Eu o adotei porque vejo sentido na paternidade“, explica.

    Edmar e Wallace Oneda. Foto: Arquivo pessoal

    O que considerar ao decidir pela adoção?

    A adoção, apesar de ser uma demonstração brilhante de afeto, carinho e amor, é algo que precisa ser feito com cuidado e respeito às questões emocionais da criança. As pessoas esquecem que a adoção vai além do processo jurídico. É uma construção afetiva e psicológica. É um processo de vínculo“, explica a psicóloga Aline Santana.

    Segundo a especialista, é preciso respeitar as etapas e processos da adoção de modo que a família e os pais, ou a pessoa interessada em adotar, esteja de fato preparada para receber um filho em casa. “O processo precisa dessas etapas para que o Estado tenha a garantia de que essa criança não seja retraumatizada em uma família que não passou por uma preparação”, defende.

    Aline Santana explica ainda que é importante buscar apoio psicológico profissional e compreender se o momento é mesmo o ideal. Além disso, é preciso estar atento para as mudanças que virão, afinal, apesar das questões positivas, haverá também conflitos e dilemas internos.

    “Entenda suas motivações, expectativas, se prepare emocionalmente, cure suas dores e lutos porque você vai encontrar uma criança com tudo isso e precisa estar emocionalmente preparado”, finaliza. 

    Grupos de apoio para quem deseja adotar

    Outra ferramenta importante são os grupos de apoio à adoção. O Adoção Brasil, fundado Grazyelle e Wagner Yamamoto, promovem palestras, parcerias e atividades na cidade de São Paulo em prol da desmistificação da adoção.

    “Somos nós que estamos na linha de frente e trazemos conhecimentos sobre todas as esferas que envolvem este ecossistema“, explica Wagner.

    Segundo Grazyelle, o grupo busca conscientizar sobre a adoção legal e consciente, abordando os principais desafios. Entre eles, a adoção tardia, de crianças neurodivergentes ou grupos de irmãos, por exemplo.

    “Além disso, há a necessidade de orientação jurídica e psicológica. Muitos destes desafios que os pais enfrentam estão relacionadas às expectativas que são geradas neste processo“, explica a fundadora.

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