Os 7 princípios de um cidadão do mundo
No mapa-múndi, o planeta é um emaranhado de territórios coloridos muito bem definidos. Mas ao pôr o pé na estrada, as cores se mesclam e tudo vira uma coisa só. O mundo em que vivo é assim.
Cidadão do mundo é quem entende que a humanidade não é definida por fronteiras ou nacionalidades. É alguém com a convicção de que a raça humana é interconectada, e que uma ação social, cultural, econômica ou ambiental, por mais localizada que seja, pode impactar a sociedade numa ampla dimensão.
O ativismo de uma adolescente sueca pode engajar uma geração inteira para as causas das mudanças climáticas. Um homem morto cruelmente pela polícia em Minnesota pode intensificar o combate ao racismo no planeta. Não há nada tão local que não possa ser global.
Eu me identifico com essa compreensão integrada do mundo desde a infância. Fui inspirado logo cedo pelo documentarista francês Jacques Cousteau, que navegava por um oceano sem limites e me fazia entender que todo aquele planeta também era meu. Não esqueço das revistas National Geographic do meu avô, nas quais eu me maravilhava com povos, tradições e costumes tão diferentes dos meus, mas ainda assim pertencentes ao mesmo lugar que eu vivia.
Pra ser, é preciso se reconhecer
Mas só foi há alguns anos que tomei consciência de que este pertencimento e fascínio pela humanidade me tornava um cidadão do mundo. Isso foi em 2015, quando decidi deixar de ter uma casa fixa para ter uma vida itinerante filmando séries estrada afora com minha esposa, a Diana.
Neste meu artigo de estreia na Vida Simples, escolhi fazer uma viagem reflexiva sobre como é viver assim e, despretensiosamente, cheguei a 7 princípios essenciais sobre esta ideologia de vida. Por ser um texto pessoal, talvez ele não defina o que é toda pessoa cidadã do mundo, mas não há dúvida de que ele apresenta o retrato preciso de como eu vivo este ideal.
Nestas linhas, enquanto eu me descubro, também me exponho. Porém, como todo bom cidadão do mundo, faço desta vulnerabilidade o caminho para inspirar uma vida mais coletiva e comprometida com o planeta.
1. Ser cosmopolita
O termo remete às escolas filosóficas Cínica e Estóica, e em sua etimologia significa cidadão do mundo (kosmopolitês: kosmos = universo, mundo; politês = indivíduo da cidade, cidadão).
Sua natureza é promover a perspectiva de que, antes de ter uma nacionalidade, somos todos seres humanos. E para alcançar justiça social universal é preciso estabelecer preceitos éticos de igualdade entre as pessoas. Eu sou cosmopolita quando aceito as diferenças, incentivo a diversidade e respeito as pessoas de forma igualitária. A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 foi construída com base neste princípio.
2. Celebrar a multiculturalidade
Se por um lado, como cidadão do mundo, eu defendo sermos todos uma mesma comunidade, por outro promovo a ideia de que as diferenças culturais e identitárias são alicerce para a existência da humanidade contemporânea. É na diversidade que encontramos equilíbrio e soluções para os desafios globais.
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3. Sentir-se plurinacional
Tenho costume de fazer a tapioca x-caboquinho que conheci em Manaus, de comer hommus da forma como aprendi em Tel Aviv e de tomar chá com leite que tomava em Londres. Meus hábitos alimentares são fruto de dezenas de experiências que tive na vida.
Por estar familiarizado com 4 idiomas, passei o domingo ouvindo uma rádio francesa, amanhã tenho uma reunião em inglês e ontem assisti a um filme em espanhol, sem deixar de falar português diariamente. É habitual eu usar todos ao mesmo tempo para me expressar.
Ao mesmo tempo em que as raízes de onde venho me definem, sinto que sou um pouco de cada canto do mundo onde estive. Ser cidadão do mundo é entender que transcendemos um único território.
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4. Ser flexível
Ao passar os últimos 8 anos vivendo sem lugar fixo, entendi que ao me adaptar a diferentes contextos, me permito estar em constante transformação. E quanto mais conheço as virtudes de viver em adaptação, mais percebo quão negativa é a obsessão humana de querer transformar, a qualquer custo, os lugares onde está.
Ser flexível com o ambiente em que estamos e com as pessoas com quem convivemos nos faz mais compreensivos, tolerantes e generosos com o mundo ao redor.
5. Contribuir para a harmonia global
Quando opto por enxergar a humanidade como um só grupo, inicialmente relego a ideia de dividi-la em nações. Então, ao valorizar, antes de qualquer coisa, o que nos torna iguais ao invés do que nos diferencia, estou concebendo uma perspectiva harmônica de sociedade.
Ao contrário da onda ultranacionalista e de patriotismo descomedido que avança em alguns países, na qual se prega a supremacia de uma nação às outras e que descamba inevitavelmente em conflitos e clima de ódio, ser cidadão do mundo é preterir a paz e a harmonia entre as pessoas e com o meio-ambiente.
6. Valorizar a liberdade
Com o avanço tecnológico e o movimento global de incentivo ao nomadismo e ao trabalho remoto, tenho cada vez mais liberdade para transitar pelos países que escolho ir e, quase sempre, tenho liberdade para manifestar minha opinião, seja através da minha arte ou não.
Portanto, quando há circunstância e garantia para a sociedade ser livre, tanto para se locomover como para se expressar dentro das regras limpas da harmonia global, permite-se duas coisas: primeiro que a gente se aproprie do planeta, porque ao explorar o mundo a gente o reconhece como nossa casa, e da nossa casa a gente cuida, e segundo, que a gente se aproprie de si mesmo, porque quando não temos voz, somos invisíveis, e quando temos liberdade para nos comunicar, existimos. E não dá para ter a si mesmo se não notarmos nossa existência.
7. Saber cooperar
As séries que filmei pelo mundo, como “What If Collab” (Amazon Prime Video), estimulam a colaboração. Mais do que isso, refletem sobre como a atitude de nos juntar a outras pessoas gera ambientes mais cooperativos, seguros e felizes.
Como diz o historiador israelense Yuval Harari, a cooperação talvez seja o maior desafio para a humanidade do futuro. Não saber como se unir para solucionar problemas, pode ser fatal à raça humana. E para um cidadão do mundo, que reconhece que juntos somos mais fortes, saber cooperar é imprescindível para garantir um planeta mais pacífico, fértil e próspero.
LEO LONGO vive desde 2015 na estrada filmando suas histórias de colaboração com artistas dos cinco continentes. Na vida sem endereço fixo, entendeu que sua casa é o mundo. Diretor, filmmaker e ativista do minimalismo, compõe o duo Couple of Things ao lado de Diana Boccara.
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