Seu plano B em prática: um manual para mudar de profissão
Sim, você pode largar tudo e se jogar numa nova ideia profissional. Para ter mais chances de sucesso, saiba como criar um plano B e ir transitando para uma nova carreira, um novo caminho de sucesso.
- Primeiros passos para colocar o plano B em prática
- Descubra do que você gosta
- Se sentiu perdido?
- Faça experimentos enquanto está no plano A
- E se o que eu amo não dá dinheiro?
- Dedique tempo ao projeto
- Para não saltar no escuro
- Faça um cronograma de metas mais robusto
- Não sucumba à paralisia por análise
- Deu errado? Faça como o Waze e recalcule
Por muitos anos, eu busquei meu plano B, incomodada pela desconfiança de que não sabia fazer nada além de reportagem. Até ouvir da minha analista que meus gostos poderiam me levar a algum lugar. Se não a um plano B propriamente dito, pelo menos a um ponto mais próximo da satisfação pessoal.
Com um emprego fixo para me amparar, segui o conselho e, em vez de pensar dia e noite no que seria minha segunda carreira, fui a mais museus, cinemas, visitei mais exposições. Batizei esse flanar de método jardineiro fiel em referência a um livro da Clarissa Pinkola Estés (O Jardineiro Que Tinha Fé, ed. Rocco). A história trata de um processo espiritual de preparar o “terreno” para que a semente certa, quando tocar o solo, o torne rico de novo. E lá estava eu tocando a minha vida quando fui a uma exposição de manualidades e vi um trabalho de joalheria artesanal. Era a “semente” encontrando seu solo fértil.
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Primeiros passos para colocar o plano B em prática
Me inscrevi em um curso livre de joalheria para checar se o gosto combinava com a habilidade. Deu tanta liga que um ano depois lancei minha primeira coleção de joias – não por acaso com um olhar para aquilo que nasce espontaneamente na natureza, as PANC (plantas alimentícias não convencionais).
Bem, essa foi a minha trajetória. Mas existem vários caminhos para chegar ao plano B. Percebi, no entanto, que algumas pistas ajudam a guiar essa aventura. Com a ajuda da Raíssa Kill, gerente de inovação e economia criativa do Sebrae, da psicóloga Débora Bliacheriene, do criador do perfil @tira.do.papel Tiago Rêgo Henriques e da Cristina Holland, uma empreendedora que tem frescos na memória os caminhos por onde andou, Vida Simples traçou um manual para dar corpo a uma ideia e fazê-la acontecer. Sem romancear. Pois, como disse Tiago, também criador do curso Vambora, “o maior mito do empreendedorismo é que será uma vida fácil. Não será. Os problemas apenas serão diferentes”.
Para estruturar tal roteiro, consideramos o seguinte tripé: uma viagem de autoconhecimento para descobrir o que você gosta e tem competência para fazer; planejamento financeiro e de metas para ninguém saltar no escuro; e constância para criar o hábito e tornar a transição mais fácil. “Tentar fazer tudo de uma vez costuma assustar e congelar”, sinaliza Raíssa. A ordem dos passos é apenas uma sugestão. E nada precisa ter pressa. A ideia aqui é apenas dizer que é possível e jogar luzes para tornar sua jornada real.
Descubra do que você gosta
Isso pede autoconhecimento, claro. Uma voltinha aos tempos de infância pode colaborar. O que você gostava de fazer? Com o que mais gostava de brincar? Quais eram seus sonhos?
“Recuperar esse caminho funciona como uma bússola interessante, pois lá está a essência de quem você é”, orienta a psicóloga Débora Bliacheriene, de São Paulo. É óbvio que a vida adulta faz a gente abrir mão de alguns sonhos, só não podemos nos perder dessa essência. Esse é o ponto para não se frustrar. “Conheço uma advogada que estava infeliz no emprego corporativo.
Ela escolheu o Direito, no entanto, porque, quando pequena, queria fazer o bem. A saída, ela percebeu depois de um tempo de análise, não era mudar radicalmente de trabalho, mas usar seu conhecimento no terceiro setor, onde conseguiria realizar o desejo lá de trás”, conta a psicóloga.
Se sentiu perdido?
Diante do oceano de possibilidades, é normal que muita gente não saiba por onde seguir. Simplesmente se deixe guiar pela vontade de sentir prazer novamente. Não importa se é para virar um plano B.
Importa é mexer no terreno fértil da criatividade. “O conselho que eu dou é: ‘não ligue tanto para o que as pessoas vão pensar. Se quer fazer teatro, faça. Siga a intuição. Ao testar novas atividades, o mínimo que pode acontecer é você descobrir o que não quer”, destaca Débora.
O físico Albert Einstein tinha uma tática: em vez de se esgotar tentando resolver um problema matemático, mudava o foco e ia tocar violino. A música o ajudava a conectar diferentes partes do seu cérebro. Nessa abertura de canais, saem o ego e a pressão para encontrar uma solução, entra a tranquilidade. E um raciocínio que antes estava embotado tem licença para chegar.
Faça experimentos enquanto está no plano A
“Hoje em dia é muito mais fácil experimentar rotas alternativas enquanto se está em um emprego seguro”, pondera Tiago Rêgo Henriques, que está para lançar Erra Uma Vez, um livro sobre as inseguranças de um personagem que deseja trazer um projeto ao mundo.
Você pode ser uma engenheira que ama fotografia, mas detestar a experiência de fotografar clientes com hora marcada. E nem todo mundo se dá bem como dono do próprio negócio. Quem precisa de rotina e estabilidade financeira poderá sentir mais dificuldade. É importante ser sincero consigo para não se frustrar.
Por isso Tiago defende uma mistura de mão na massa com empatia para trabalhar gradualmente as inseguranças. “No fundo, tudo se resume a quebrar desafios complexos em pequenas peças. Você tem o seu objetivo no topo e alguns degraus para chegar até ali.”
E se o que eu amo não dá dinheiro?
Cuidado. Às vezes um hobby é só um hobby. Para virar seu plano B, ele precisa gerar renda, senão transitar para uma nova carreira não poderá ser bem sucedido. “Isso vai exigir sair do apaixonamento para ver com racionalidade o que é necessário ao novo campo de atuação”, alerta Raíssa Kill.
“Pode não dar certo porque ou você não faz aquilo tão bem (qualidade e eficiência são fundamentais para permanecer no mercado), ou porque não sabe cobrar. Pessoas que trabalham com economia criativa, como ilustradores e artistas, sentem mais dificuldade em precificar seus trabalhos, observa Raíssa. Ela cita ainda o caso de um sushiman cujo sonho era ter um restaurante na Rua da Glória, tradicional reduto da gastronomia japonesa em São Paulo.
“O aluguel naquele ponto era muito acima do que o empreendedor podia aguentar. O apaixonamento cegou e trabalhou contra”, diz ela. Não dá para queimar etapas.
Dedique tempo ao projeto
Plano B, para sair do papel, precisa de dedicação de tempo. O quanto e como cada um vai se organizar para isso difere de acordo com sua disponibilidade e a complexidade da ideia. Defina o seu modelo: quatro horas do seu sábado? Uma hora por dia? Uma hora três vezes por semana?
E, dica da Raíssa, link com um hábito diário. Reserve uma hora de manhã, depois do banho, por exemplo. Nesses 60 minutos, cuidado com as interrupções (nada de WhatsApp!). “Esse compromisso consigo é fundamental. Assim como fazer um cronograma de atividades e segui-lo à risca. Eu tiro alguns minutos para rascunhar as tarefas da semana: segunda, pesquisar influenciadores que fazem o que eu quero fazer; terça, selecionar três para esmiuçar melhor; quarta, dissecar um curso que estava no radar… e assim por diante.”
Pouco com constância, lembra?
Para não saltar no escuro
Apesar de a transição de carreira pedir uma certa ousadia, não é desejável nem justo que seja perigoso. Segundo dados do Sebrae, o brasileiro é ótimo em iniciativa e persistência, mas ruim de planejamento e cálculo de riscos.
“As pessoas acabam tendo medo da palavra planejamento porque isso lhes parece muito complexo. Então, primeiro passo: desmistificar essa ideia. O planejamento começa com um mapeamento simples de gastos. A pergunta-chave aqui é: quanto você precisa para viver por mês”, ensina Raíssa.
Coloque na ponta do lápis absolutamente tudo: aluguel, condomínio, internet, celular, água, luz, comida, plano de saúde, escola, transporte… Ao descobrir o valor, multiplique- -o por seis. Esse será o fundo de reserva mínimo necessário para começar a pensar em empreender. Se você não faz esse colchão, vai se colocar em risco.
Faça um cronograma de metas mais robusto
Depois de habituar-se a dedicar um tempo ao seu projeto de plano B, pode ser a hora de procurar o Sebrae que te apoiará nos detalhes, conselhos, orientações e lições importantes para transitar para uma nova carreira.
“Muitos não sabem que podem ter um atendimento gratuito no serviço. Essa uma horinha que você vai disponibilizar da sua semana pode ser para ir ao Sebrae validar o seu modelo de negócio desde o momento em que ele ainda é embrionário até os passos seguintes, de experimentação, pesquisa, estratégias”, divulga Raíssa.
Um recurso que ajuda o empreendedor a verificar a viabilidade do seu plano B é a chamada ferramenta SMART. Validar sua ideia com pessoas que entendem da área, fazer laboratórios, visitas e ouvir um feedback delas (assim como dos potenciais clientes) é outra condição vital à existência de um negócio.
Não sucumba à paralisia por análise
Se por um lado há as pessoas que se jogam no plano B sem planejamento, também há aquelas que nunca tiram a ideia do papel por achar que jamais estão prontas para transitar para uma nova carreira.
Esse excesso de pesquisa que paralisa é bem comum. “O cronograma fica tão cheio de tarefas, com tantos livros para ler, e o aprendizado tão profundo, que você acaba estagnado, com medo de expor sua ideia”, analisa Raíssa Kill.
Se já conversou com quem queria, fez os laboratórios necessários, se planejou financeiramente, mostrou um “protótipo” do que pretende vender e ouviu os feedbacks necessários de quem entende do assunto – e, claro, os considerou (porque a maioria das pessoas tem dificuldade de receber críticas à sua ideia!) –, é hora de tirar o plano B do papel e fazer acontecer a nova carreira.
Deu errado? Faça como o Waze e recalcule
Empreender é muito mais uma jornada de passos errados até acertar, como mostra a trajetória da Cristina Holland. Deprimida devido a um divórcio difícil, que culminou em sua demissão de uma multinacional, a gerente de marketing tentou se recolocar, sem sucesso. Decidiu ir para os Estados Unidos fazer um curso de administração e, de volta ao Brasil, estava se preparando para abrir uma franquia quando a pandemia explodiu.
“Senti que, se nada desse certo, eu poderia dar aula de inglês.” E ela não imaginava que isso poderia dar tão certo. Hoje, a Holland English tem 30 alunos e prova que marketing, business e inglês são conhecimentos relevantes no mercado. Depois de bater na trave algumas vezes, Cristina acertou o gol. Mérito dela.
KÁTIA STRINGUETO é uma jornalista que conseguiu encontrar seu plano B na joalheria autoral e, desde então, além do papel, usa os metais para expressar seu sentimento de mundo. @katiastringueto
Este conteúdo foi originalmente publicado na edição 235 de Vida Simples
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