Não. Não é “preto” ou “branco”. Os debates sobre a geração Z e o mercado de trabalho têm inflamado as discussões nas redes sociais, na imprensa e no ambiente corporativo.
Inovando em relação as gerações anteriores, as particularidades dessa geração, marcadas pela afirmação de diferentes identidades, revelam um potencial que pode ser aproveitado pelas empresas.
Essa diversidade de gênero, raça, deficiência e orientação sexual, característica que predomina entre os jovens, pode ser aplicana na transformação do mundo do trabalho.
Também chamados de “zoomers”, os jovens da geração Z são aqueles nascidos entre 1995 e 2010, muitos dos quais já iniciaram uma trajetória no mercado de trabalho. Receberam o nome a partir da palavra “zap”, que em inglês se refere à agilidade, energia e dinamismo.
Também conhecidos como “centennials”, a geração Z no Brasil é, contudo, demograficamente bem diferente de outros países.
Com dimensões continentais, o país tem uma parcela da população em zonas rurais, quilombos, territórios indígenas e nas periferias das grandes cidades.
Então, não: a geração Z não é sobretudo um grupo de jovens classe média alta que rejeita cargos de liderança na Faria Lima.
Segundo dados do Censo de 2022, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil há 47 milhões de pessoas nessa faixa etária.
Destes, a população entre 15 e 29 anos é a que menos se identifica como branca, com 48,7% se considerando pardos. Um número mais preocupante mostrou que 22,3% (10,9 milhões) não estuda e nem trabalha.
A geração Z brasileira
No Brasil, é praticamente impossível analisar os zoomers sem considerar as desigualdades econômicas, sociais e regionais que formam um mosaico diverso em todo o território.
“Enquanto em outras partes do mundo as oportunidades de trabalho podem ser mais uniformes, aqui as condições de acesso variam muito”, explica Daiane Freitas, psicóloga especialista em Gestão de Pessoas e mestre em Administração de Empresas.
Para a especialista, o trabalho no Brasil sempre esteve associado à sobrevivência e à mobilidade social. “O que faz da Geração Z uma força de trabalho diversa e complexa”.
A psicóloga, que também é professora da Universidade Cruzeiro do Sul, defende que as organizações precisam entender e acolher as diferenças.
“Empresas devem promover a inclusão não apenas como uma estratégia corporativa, mas como uma necessidade social em um país tão plural”.
As características sociais e demográficas do país impactam diretamente as oportunidades e expectativas dos jovens, já que não há equidade entre as regiões em relação ao acesso à educação, ao emprego e à inclusão.
“Para que as empresas se conectem com esses talentos de forma autêntica, é preciso adaptar suas estratégias, criando ambientes inclusivos e valorizando a diversidade, para enfim promover inovação e crescimento sustentável”,
esclarece Juliana Alencar, CEO e fundadora da W.G., uma garagem de inovação, capacitação executiva e transformação cultural para empresas.
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O mercado está de olho na diversidade
Segundo Juliana Alencar, a sociedade passa por um momento que há mudanças no comportamento social que as empresas devem avaliar.
Se a geração Z exige maior inclusão dentro das equipes e departamentos, a diversidade é, portanto, um dos pontos fundamentais para alavancar o potencial de competitividade no mercado a longo prazo.
“De forma simples, quanto mais diversidade uma empresa possui, maior é sua capacidade de desenvolver produtos e serviços que atendam a múltiplos mercados e públicos, reduzindo pontos cegos que poderiam prejudicar seu crescimento ou levá-la a falhas inesperadas”, diz a especialista que é professora da People Skills na Link School of Business.
Empresas inovadores que têm alavancado espaço dentro do mundo corporativo mostram que a diversidade é fundamental para o sucesso e resiliência. O assunto é sério e motivou até mudanças estruturais dentro de grandes organizações.
“A B3, por exemplo, já anunciou que as empresas que desejam abrir capital precisarão ter um percentual de diversidade como requisito obrigatório”, explica Juliana.
E ela não é a única, já que diferentes bolsas de valores no mundo adotaram critérios claros sobre diversidade.
Uma geração que veio para mudar?
A geração Z, a mais recente a entrar no mercado de trabalho, representa uma ruptura com os modelos tradicionais e redefine a relação entre vida pessoal e carreira, segundo aponta Daiane Freitas.
“Para eles, o sentido do trabalho foi ressignificado, focando mais na satisfação pessoal do que apenas em conquistas financeiras.”
Essa é a primeira vez que os boomers, a geração X, os millenials e centennials convivem ao mesmo tempo no mercado de trabalho brasileiro, e isso é um desafio.
Há diferentes demandas, visões de mundo e prioridades em relação ao trabalho. Apesar disso, a geração Z se destaca por ter uma baixa tolerância a ambientes de trabalho tóxicos e exaustivos.
“Isso não é apenas um traço geracional, mas sinaliza uma transformação maior nas expectativas em relação ao trabalho”, diz Daiane Freitas.
Além de demandarem autonomia, propósito e ambientes saudáveis, a mudança de percepção tensiona as estruturas hierárquicas.
“Empresas que não fizerem essa transição enfrentarão uma crise de engajamento, especialmente à medida que a flexibilidade e o respeito ao bem-estar se tornam cada vez mais essenciais para atrair e engajar talentos”, diz.
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Com geração Z, cargos de liderança são revistos
Um estudo realizado pela Visier, uma plataforma de análise de pessoal e planejamento da força de trabalho, revelou que 91% dos profissionais autônomos não têm interesse em assumir cargos de gestão de pessoas.
Entre os motivos, expectativas com aumento de estresse e pressão, ou simplesmente uma satisfação com o cargo atual.
Juliana Alencar destaca que, historicamente, sempre houve uma curva forçada em relação ao plano de carreira nas empresas.
Isso significa que os profissionais que tinham maior desejo em alavancar o salário precisavam crescer profissionalmente e, por isso, tornavam-se líderes.
O problema? “Nunca foi levado em consideração se você não tinha aptidão, talento ou gostava de lidar com pessoas”, diz.
“Não há como culpar um profissional por isso, afinal, todos têm sonhos e responsabilidades”, acrescenta. O modelo, apesar de ainda ser muito usual, projetou uma série de líderes despreparados.
Recentemente, empresas do Vale do Silício, o pólo de produção de tecnolgia e de outros ecossistemas de inovação, têm finalmente rompido com esse paradigma, introduzindo a gestão em Y.
“Isso significa que, para crescer e ser bem recompensado, não é obrigatório liderar pessoas. Há a opção de se tornar um especialista em uma área específica”, avalia.
O modelo tem ganhado força em todo o mundo e tem reservado os cargos de liderança aos funcionários com perfil para ocupar o cargo.
Mas há também questões comportamentais. “As lideranças nunca foram tão criticadas e responsabilizadas por questões como ambientes tóxicos, falta de desenvolvimento dos times, saúde mental, e resultados”, diz Juliana.
O cancelamento nas redes sociais pode gerar um receio em assumir cargos que tenham posição de destaque, acredita a especialista.
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