Apesar de não serem recíprocos, vínculos com figuras públicas são legítimos
Relações parassociais, em que há laços emocionais com pessoas que não conhecemos pessoalmente, podem ser profundos e reais

Sabe aqueles momentos em que você está assistindo um filme e fica feliz que um determinado personagem entrou em cena, quando recebe a notificação que um influenciador que gosta muito postou algo, ou mesmo quando se depara com uma notícia que um famoso ganhou um prêmio e fica contente pela conquista? Tudo isso vai muito além da idolatria, são vínculos construídos entre você e a outra pessoa, mesmo que não se conheçam pessoalmente. E tem nome: relação parassocial.
Esse tipo de relação é construída com alguém que não está, de fato, presente na sua vida, e assim há um laço afetivo de uma via só. A outra ponta pode ser um cantor, um personagem, um atleta, um influenciador, etc. São pessoas que conhecemos, que admiramos, sentimos falta, mas que não sabem que existimos.
“Nosso cérebro não diferencia tão bem o real do simbólico quando estamos emocionalmente engajados. Ver alguém frequentemente, ouvir sua voz, acompanhar suas ideias, cria uma sensação de intimidade muito genuína. A gente sente de verdade que conhece”, explica a psicóloga e neuropsicóloga Dayane Louise.
As relações parassociais são muito comuns e nem sempre se apresentam como a relação entre fã e ídolo. Às vezes, certa pessoa te faz bem pelas coisas que fala e faz publicamente, e o vínculo emocional que estabelece com ela não precisa ser de idolatria, mas de inspiração, bem-estar, reconhecimento.
“Ali, entre vídeos, livros, músicas ou cenas, vamos construindo uma ponte emocional com aquela figura e, muitas vezes, ela nos ajuda a atravessar fases difíceis da vida.”
Respeito às relações
A relação parassocial funciona como apoio, companhia e inspiração, mas precisa de atenção – como qualquer outra relação afetiva. “Quando passamos a depositar todas as nossas expectativas ou necessidades emocionais em alguém que não pode corresponder, corremos o risco de nos frustrar, nos isolar ou perder o contato com as relações reais que também precisam de espaço”, explica Dayane.
Idealizar alguém pode fazer esquecer que do outro lado da tela existe um ser humano complexo, com defeitos e problemas pessoais. A frase “nunca conheça os seus ídolos” não é o caso, mas tente diminuir as expectativas.
Infelizmente, pessoas que se envolvem emocionalmente com figuras públicas sofrem julgamentos – vistas como “carentes” e “iludidas”. Segundo a neuropsicóloga, esse preconceito mostra a grande dificuldade da sociedade em aceitar e respeitar a diversidade das experiências emocionais.
“Mulheres, adolescentes, pessoas neurodivergentes ou que enfrentam solidão, muitas vezes são as que mais sofrem com essa desvalorização. Como se o que sentem fosse menos legítimo por não seguir o roteiro tradicional das relações.”
Ao ouvir a frase “mas você nem conhece essa pessoa”, lembre-se que seus sentimentos são válidos e que as relações parassociais são reais, mesmo que não recíprocas. Se alguém te faz bem, te inspira e te ajudou em um momento difícil, mesmo que de muito longe, há um grande valor e merece respeito.
Um caminho alternativo é procurar outras pessoas que compartilham os mesmos sentimentos. Se gosta de algum jogador de futebol, com certeza os torcedores do time tem esse mesmo apreço; se gosta de um ator, há outros fãs na internet; se tem afeto por um influenciador, há comunidades que vão te entender. No final, a relação parassocial pode ser uma porta para conhecer novas pessoas e construir relações de amizade.
“As relações parassociais mostram que o afeto é criativo, simbólico e muito mais amplo do que os vínculos tradicionais. Elas nos lembram que, mesmo à distância, podemos ser profundamente tocados. E isso também é humano. Se você se reconhece nesse tipo de vínculo, saiba que não há nada de errado em sentir — pelo contrário, isso mostra o quanto você é sensível, capaz de criar significados e conexões.”
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