Em meio a um mercado da beleza marcado pelo excesso de consumo e pela promessa de resultados imediatos, cresce um movimento que propõe um novo olhar sobre o autocuidado: a beleza limpa, que consiste em ser mais consciente, gentil e conectada com “o que realmente importa”. O conceito tem como base o uso de produtos com fórmulas limpas, veganas, elaboradas com ingredientes naturais e que não envolvam testes em animais, além de embalagens biodegradáveis.
Assim também propõe o livro “Guia da Beleza Consciente: uma Jornada em Direção a uma Prática de Cuidados Mais Naturais, Sustentáveis e Atentos”, escrito por Marcela Rodrigues, jornalista, facilitadora e designer para sustentabilidade e regeneração. Na obra, a autora traça o panorama do movimento e mostra caminhos para adotá-lo em uma jornada democrática e simples.
‘Uma beleza mais segura, gentil e justa’
A beleza limpa é um conceito que acredita no desenvolvimento de uma indústria da beleza mais justa, transparente e ética por meio de rotinas de cuidados naturais, simplificadas e gentis com os organismos. Mesmo com pilares voltados para o mercado da beleza, cosméticos e bem-estar, o movimento é um conjunto de atitudes com poder de transformação pessoal.
Além disso, há também a “beleza natural”, termo associado às formulações de cosméticos e produtos, mas com os mesmos objetivos de alcançar um bem-estar sustentável e saudável.
“É uma beleza mais segura, gentil e justa para todas as formas de vida. Afinal, foram movimentos que surgiram e cresceram não por uma necessidade da indústria, mas pessoas com o desejo de uma vida mais atenta, sustentável, consciente e autônoma”, explica Marcela Rodrigues.
Para Marcela, o termo “beleza consciente” contempla todas essas ideias sobre a nova consciência de estética e cuidado, além do cultivo de uma visão holística (observar os aspectos de forma integrada) sobre o tema.
(Foto: Divulgação) Marcela Rodrigues convida a uma jornada de autocuidado mais natural e sustentável
Consumo e panorama brasileiro
Esses movimentos mostram a importância frente às atuais lógicas de consumo. “O problema não é o consumo, e sim o consumismo. E, infelizmente, o que vemos hoje, por parte da grande indústria e da grande mídia, é um estímulo ao consumismo.”
Dentro das redes, ambientes, propagandas e obras culturais, a beleza é uma consequência da compra e o bem-estar é um produto. Cosméticos e procedimentos viraram os protagonistas dos momentos de cuidado e promoção do que é belo.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, em panorama publicado em 2025, o setor brasileiro foi o terceiro maior mercado consumidor do mundo. Além disso, o Brasil é:
- 2° em consumo de fragrâncias, produtos masculinos e desodorantes;
- 3° em consumo de produtos para cuidados com o cabelo;
- 7° em consumo de maquiagem;
- 8° em consumo de produtos para cuidados com a pele.
Só porque esse tipo de consumo ainda é grande no Brasil, não significa que a indústria de produtos sustentáveis e naturais não tenha crescido. “Eu venho acompanhando esse movimento e o mercado há onze anos. Ele cresceu e ganhou novos contornos, inclusive por parte do mercado. A inovação potencializou a eficácia dos cosméticos naturais e muitos mitos caíram por terra”, aponta Marcela.
Mas, a transição da beleza consumista para a beleza consciente enfrenta desafios para alcançar os compradores. “Fora da bolha das pessoas que têm alguma causa ou conexão com este movimento (saúde, estilo de vida, meio ambiente, veganismo, entre outros), não tem tanta disposição para sair da zona de conforto. Soma-se a isso o lobby da grande indústria que antes usava a estratégia de negar e hoje gera dúvidas.”
A especialista aponta que é um momento delicado para a indústria da cosmética natural, já que essas marcas são cobradas para se assemelhar em produção, estratégia e comunicação à grande indústria.
“Criticam as embalagens simples, os aromas naturais e até a comunicação mais slow. Mas não seria esse o combo que, por trás de tudo, sustenta um negócio natural? Não seria autenticidade? Porque algo que não parece high-tech não pode ter performance?”
O que sustenta o movimento natural e sustentável é o artesanal. Pequenas marcas e empresas que, apesar de não terem grande destaque de nome – como os grandes conglomerados – são pilares para fortalecer o consumo local de forma justa e saudável.
“Por parte do mercado, as marcas têm muita limitação, uma vez que matéria-prima de qualidade ainda tem um valor mais alto, assim como seguir uma cadeia sustentável e não uma escala.”
Muito mais do que comprar produtos artesanais
A nível pessoal, adotar a beleza consciente envolve seguir o próprio ritmo e permitir-se momentos de reflexão sobre seus hábitos de consumo.
“É preciso desacelerar e colocar mais atenção nesses momentos de cuidados, que são seguidos no modo automático sem questionar a escolha, o modo que se pratica. Quando desaceleramos e colocamos atenção plena, seguindo um ritmo próprio, é que abrimos espaço para sentir e questionar genuinamente: eu preciso mesmo disso tudo? Esse incômodo veio de dentro ou de fora? Meus desejos de consumo ou mudanças na aparência são motivados por quem ou pelo quê?”, diz Marcela.
Por isso, ela manifesta a frase “mais rituais, menos coisas” como incentivo a uma vida em que o cotidiano é vivido em reflexão e em ações intencionais. Por exemplo, ritualizar os cuidados com a pele ao mesmo tempo que usa produtos sustentáveis.
Sobre a transição dos hábitos, não é necessário trocar todos os hábitos e produtos de uma vez. No livro, Marcela indica estratégias simples e intuitivas que podem ajudar. “Gosto de sugerir receitas caseiras, uma prática muito forte na Europa, onde a beleza natural tem uma pegada mais slow e simples mesmo.”
Entre os rituais e as receitinhas, as sensações se tornam as protagonistas do autocuidado e os produtos se mostram apenas como complementos. O foco é o sentir.
“Me formar em yoga, estudar herbalismo, aromaterapia, agrofloresta, economia circular, ginecologia natural e ayurveda me ajudou a ligar muitos pontos e ter uma visão sistêmica, estratégica e intuitiva para conectar beleza e bem-estar à sustentabilidade e regeneração.”
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