A arte de ser bordadeira
Entre linhas e agulhas, Mariana encontrou, no trabalho manual, uma forma de expressão autêntica e poderosa de quem é e do que deseja para o mundo
Entre linhas e agulhas, Mariana encontrou, no trabalho manual, uma forma de expressão autêntica e poderosa de quem é e do que deseja para o mundo
Foi no repouso obrigatório durante a segunda gestação, em 2017, que Mariana Weigand se reencontrou com o bordado. Quando pequena, tinha um interesse especial pelas artes manuais: acompanhada da mãe, ia ao armarinho da cidade para se inscrever em cursos de ponto cruz, uma das técnicas usadas pelas bordadeiras. Era, como costuma dizer, a mascote das turmas, já que o público era predominantemente formado por mulheres bem mais velhas. Aos sete anos, andava com uma caixinha de linhas coloridas pela casa.
Um pouco maior, resolveu se aventurar em aulas de pintura e escultura. “Aprendi técnicas de pintura a óleo, em acrílico, em tela… Se tinha algo novo, corria aprender. Acho que isso nasceu comigo”, conta. A paixão era tão grande que acabou inspirando os pais a alimentarem suas veias artísticas também. “Meu pai faleceu há cinco anos, quando eu estava esperando meu primeiro filho. No fim da vida, se você entrasse na sala dele, via telas e tintas por todos os cantos. E tudo começou por mim. Tenho um baita orgulho disso, porque, normalmente, são os pais que inspiram os gostos dos filhos, né? Por aqui, foi o contrário”, revela.
A época de faculdade chegou e Mariana foi estudar arquitetura. Logo depois, começou a trabalhar em escritórios da área, até abrir o próprio junto ao marido e mais um sócio, em São Paulo. Era uma rotina intensa, de muito trabalho, conciliando projetos, clientes e fornecedores. O fazer manual ficou adormecido. Quando Matias, seu primogênito, estava com três anos, engravidou do Tomas. Em dado momento da gestação, um exame de ultrassom indicou que o bebê estava com restrição de crescimento. “Você precisa desacelerar. Essa criança precisa da sua energia restabelecida. Vá para casa e faça repouso. E repouso significa não trabalhar, nem à distância”, recomendou a médica.
Obrigada a dar uma pausa, o bordado apareceu em sua vida mais uma vez. Agora, Mare, como gosta de ser chamada, não se contentava só com as pequenas agulhas. Pairava no ar um chamado à experimentação, de abertura ao novo, um despir-se de técnicas consagradas para dar lugar ao que sua mente criativa sugestionava. Nasceu Tomas e, junto dele, a coragem para se entregar ao fazer artístico e torná-lo sua profissão. A primeira encomenda foi do Matias, o filho mais velho. Pediu um coração. Depois, ela fez um porta-maternidade para uma amiga. Assim, começaram os pedidos, a página no Instagram, o ateliê Mare à Mão, a mistura de bordado com aquarela. “Eu sou muito grata aos meus pequenos. Foram eles que me deram a boa ousadia de largar uma carreira estabelecida para arriscar transformar meu sonho de menina em realidade”, diz.
A arquitetura seguiu com ela, uma vez que todos os bastidores, assim como os projetos, são feitos sob encomenda. Uma das partes que Mare mais gosta do novo ofício é a de ouvir a história das pessoas e perceber aquilo que elas não dizem, o que está nas entrelinhas. “Esse é o trabalho do arquiteto também. Ouvir o não dito. É planejar um espaço em que a pessoa entre e diga ‘era exatamente isso que eu precisava e não soube explicar, mas você entendeu tudo’. O mesmo acontece ao conversar com alguém que me faz um pedido. Por vezes, quando entrego o bastidor, o cliente me fala ‘essa é minha cor favorita! Como você sabia?’. Eu não sabia, mas percebi. Essa é a delicadeza que mora no fazer com alma”.
Depois, vieram as oficinas para leigos e o projeto social com mulheres de baixa renda em Atibaia, no interior da capital paulista. “Eu acabei despertando nelas um amor especial por esse universo. Elas encontraram também uma forma de contribuir com a renda de suas famílias. Com o meu sonho, estou ajudando a realizar o de outros”, compartilha, emocionada.
Nessa história de reviver a arte de ser bordadeira, encontrou no armário, aos 35 anos, a caixinha da infância. Naquele dia, foi como se dissesse a si mesma: “ei, Mare, deu tudo certo. Nós conseguimos. Obrigada por continuar acreditando.”.
Mare à Mão
www.instagram.com/mareamao/
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