Mudanças sociais e medicina impulsionam gravidez após os 40 anos
Mesmo com os desafios e cuidados de uma gestação de risco, quebra de padrões na sociedade e avanços na medicina reprodutiva explicam aumento de mulheres grávidas nessa faixa etária

A maternidade é um tema delicado por si só, e fica ainda mais sensível quando envolve uma gestação tardia de alto risco. Cada pessoa tem seus próprios sonhos e planos para o futuro. Entre eles, o desejo de engravidar. No entanto, os caminhos da vida nem sempre seguem como o planejado e, às vezes, levam a situações que podem gerar frustração, como alcançar uma idade em que a gravidez se torna mais difícil: depois dos 40 anos.
Mas a realidade no Brasil tem mudado. Estudo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra que houve 106 mil nascimentos de bebês de mulheres com idade entre 40 e 49 anos em 2022, um aumento de 65,7% em comparação com os 64 mil registrados em 2010.
O crescimento pode ser explicado por diversos fatores, como o avanço de alternativas na medicina reprodutiva. Além disso, a quebra de padrões na sociedade, como a busca pela independência financeira e a reorganização de prioridades femininas também contribuem para o adiamento da maternidade.
Mudanças na sociedade
A ideia de que a mulher deve ser moldada para ser uma “esposa perfeita” já ficou para trás. Nesse roteiro ultrapassado, o resultado era dependência financeira, emocional e uma vida inteira dedicada somente aos cuidados com os filhos e com a casa.
A ginecologista Fernanda Torras afirma que esse fenômeno sobre a gravidez depois dos 40 anos está relacionado às mudanças estruturais e expectativas sociais. Ela cita como exemplo o desejo por estabilidade profissional, financeira e outras realizações pessoais por parte das mulheres.
“Atualmente, muitas mulheres preferem esperar até alcançar estabilidade na carreira e na vida financeira antes de seguir com o desejo da maternidade. Existe um receio de como a maternidade pode impactar a trajetória acadêmica e profissional. Por isso, o planejamento e a segurança econômica se tornam pontos importantes na hora de tomar essa decisão”, diz.
Avanços na medicina reprodutiva
Ao mesmo tempo que a sociedade se desenvolve, a medicina reprodutiva também proporciona alternativas com maior eficiência. De acordo com Fernanda, principalmente o incentivo ao congelamento de óvulos.
“Para as mulheres que pretendem ser mães em idade mais avançada, o congelamento é uma ótima estratégia. A maioria dos especialistas incentiva o congelamento antes dos 35 anos por causa da melhor qualidade e quantidade de óvulos para o procedimento. Porém, não há idade limite”, afirma a ginecologista.
Além disso, também há a possibilidade de gestação por meio da fertilização in vitro. Atualmente, o procedimento tem taxa de sucesso entre 45% a 60% quando realizado em mulheres com até 35 anos. Acima dos 40, a chance de gravidez reduz para entre 5% a 15%. No entanto, Fernanda afirma que essas taxas evoluem cada vez mais com “técnicas de análise dos embriões pré-implantação”.
Congelamento de óvulos é uma das alternativas na área da medicina reprodutiva para a gestação tardia
Preparação física e emocional
Para além das mudanças sociais e dos avanços da medicina reprodutiva, especialistas afirmam que preparação física e emocional são fundamentais para quem pretende adiar a maternidade.
“Fisicamente, hábitos saudáveis melhoram as chances de gestação e saúde gestacional, como alimentação equilibrada, suplementação adequada e prática de atividade física. É essencial não fumar, evitar abuso de álcool, além de não usar qualquer tipo de droga ou medicamentos prejudiciais para a fertilidade e a gestação.”
Os exames realizados na fase de planejamento gestacional devem ser os mesmos em qualquer mulher: avaliação de peso, de pressão, de nutrição, laboratorial de glicemia, do perfil metabólico, das funções gerais e também rastreamento de infecções. “A grande maioria das gestações após os 40 anos evolui bem se houver um cuidado com saúde prévios à gravidez.”
“Psicologicamente, é fundamental uma rede de apoio e um acompanhamento profissional para aliviar medos, ansiedade e frustrações que o período pode gerar”, complementa Fernanda.
Riscos e cuidados
Apesar das possibilidades que a medicina oferece e da preparação para engravidar após os 40 anos, é importante se atentar aos riscos que envolvem a gestação em idade mais avançada. Por isso, o acompanhamento médico deve começar antes mesmo da concepção, com avaliações e correções de condições que possam comprometer a saúde da mãe e do bebê.
“A gravidez em mulheres com 35 anos ou mais é considerada de alto risco e deve ser acompanhada de perto por especialistas desde o pré-natal com protocolos específicos de atenção”, explica Fernanda. Essa classificação está prevista na CID 10 (Z35), que inclui monitoramento de gestações que exigem cuidados especiais.
Após o parto, o acompanhamento continua. Mulheres com idade materna mais avançada têm maior propensão a complicações no puerpério, como hipertensão, diabetes gestacional persistente, atonia uterina e maior incidência de depressão pós-parto.
Do mesmo modo, o suporte psicológico também é indicado para auxiliar no enfrentamento de inseguranças, medos e possíveis frustrações relacionados à maternidade tardia. “Mais do que nunca, a mulher precisa se sentir acolhida e bem orientada em todas as fases do processo”, conclui Fernanda.
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