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    Livro de Margot Cardoso mostra como a filosofia pode ser uma “escola para a vida”
    Unsplash Becca Tapert
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    Antes de prestar o vestibular, Margot Cardoso pensou em cursar Filosofia, mas acabou ouvindo que é uma área difícil de atuar no mercado de trabalho. Resolveu cursar Jornalismo e atuou na área por praticamente 20 anos, e é uma das colunistas mais lidas da Vida Simples. Fez uma pós-graduação em Ética na USP (Universidade de São Paulo) e a vontade de estudar filosofia voltou. Resolveu fazer mestrado em Filosofia na Universidade de Lisboa e esse longo processo de aprendizado resultou no livro A Filosofia Resolve.

    “A filosofia é uma escola para tudo e queria compartilhar aqueles pensamentos complexos com todas as pessoas, tornar a filosofia mais acessível”, conta. “Passei um semestre do mestrado estudando Heidegger e o conteúdo é muito difícil. Já Hegel escreveu a Fenomenologia do Espírito em alemão e, quando saiu a edição francesa, todos os intelectuais alemães compraram para entender melhor. Não é um conteúdo simples, mas é muito rico”, exemplifica.

    “A filosofia promove a lucidez”, resume Margot.

    Em seu livro, a autora descreve a filosofia “como uma grande farmácia que apresenta remédios específicos para dores e males. “São inúmeras as aplicações práticas que a filosofia nos oferece para enfrentarmos os desafios da vida e apaziguarmos o sofrimento. Porque a filosofia não é apenas pensamento abstrato. É também cura e consolo”, diz.

    Em A Filosofia Resolve* o leitor encontra os assuntos por temas e por autores. Margot conversou com a Vida Simples sobre o livro, confira:

    Como foi “traduzir” conceitos de filosofia para o leitor?

    Primeiro esse “traduzir” foi sempre uma espécie de missão para mim. Lamento muito que a filosofia seja tão importante, uma espécie de arte de viver, de escola da vida, mas esteja aprisionada em livros difíceis e herméticos.

    Entretanto, “traduzir” conceitos de filosofia é relativamente simples para mim, devido a minha experiência de 15 anos como repórter. O que dá mais trabalho é conectar conceitos de filosofia com a vida, com as grandes questões humanas, encontrar exemplos de fácil compreensão. É encontrar um caminho de mostrar a teoria na prática. Quando Heidegger fala sobre o “primado do sentimento” e explica por que isso acontece, fazemos as pazes com o nosso desconforto, com a nossa frustração de sermos muito pouco racionais, por exemplo.

    Outro ponto que o leitor pode contar é que me interesso muito por biologia e sempre que posso apoio conceitos da filosofia com estudos recentes da neurociência, por exemplo.

    Divulgação

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    Quais pontos da obra você destacaria?

    O livro é muito didático para facilitar a compreensão, está dividido em 11 capítulos. Não cito todos aqui, mas posso destacar os problemas que trazem a modernidade e a nossa dificuldade de lidar com eles. Vivemos num sistema, o capitalismo, que formata todas as áreas da nossa vida. Somos sobretudo consumidores. Tudo é para consumo rápido e descartável, de produtos e de pessoas.

    A tecnologia sequestra a nossa atenção contribuindo para que não enxergamos o mundo como ele realmente é — o que faz com que vivamos uma vida que não é a nossa. Vivemos no tempo das doenças neuronais, como depressão, ansiedade, bipolaridade, síndromes várias (como o pânico), burnout (somos a sociedade mais cansada de sempre) — com índices alarmantes de consumo de medicamentos para a mente. Vivemos no mundo líquido e sem rumo descrito por Bauman. Precisamos muito de orientação e cuidados.

    Há um capítulo sobre o outro, ou melhor, os outros. Há muitas definições do viver, mas a vida é sempre com o outro. O outro é tão importante que a filosofia tem um nome específico: a alteridade. A nossa missão primeira e mais importante é a construção da nossa subjetividade, e o outro é parte importante desse processo. Eu me descubro, me revelo e me reconheço no olhar do outro. Para eu me realizar como senhor, eu preciso o olhar do escravo. Não é correto dizer “eu não gosto do Pedro”. O adequado seria “eu não gosto do que sou quando estou com Pedro”.

    Há um capítulo sobre a felicidade — um tema que me perguntam sempre. O grande drama é que temos pouca capacidade para identificar a felicidade porque não fomos feitos para ser feliz. Todo o nosso aparelho psicofísico está orientado para a sobrevivência. Misturo a biologia e as ideias de Schopenhauer para desmistificar os sensos comuns incorretos sobre o que é ser feliz.

    LEIA TAMBÉM: A cura e o consolo que vem da filosofia

    Como aplicar a filosofia no dia a dia?

    Trazendo mais racionalidade e discernimento para a vida e assim desmistificar conceitos, desconstruir ideias feitas. Eu poderia dar como exemplo a questão dos modernos males da mente. A depressão é excesso de passado, a ansiedade, a síndrome do pensamento acelerado são excessos de futuro. E tudo o que está por trás disso são os medos. Aqui um desdobramento da filosofia.

    Muitas vezes, o que consideramos medo, não é medo. É temor. O medo faz parte do nosso mecanismo de sobrevivência, é medo do que está no presente, mesmo a nossa frente. O medo é muito útil. Já o temor é diferente. É um receio por algo que não existe, algo que existe apenas na nossa cabeça, é um conteúdo fabricado por nós; e aqui a filosofia pode ajudar porque ela desmonta conceitos, racionaliza ideias.

    MAIS FILOSOFIA NA PRÁTICA

    Confira as colunas de Margot Cardoso na Vida Simples


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