Projeto quer diminuir distância entre imigrantes e empresas no Brasil
Para manter a esperança de famílias estrangeiras no Brasil, projeto Empregadorismo conecta imigrantes a empresas interessadas em ampliar suas ações de diversidade Imagine a seguinte situação: você precisa deixar a família e sair do seu país de origem para tentar uma vida melhor em outro lugar. Pessoas diferentes, idioma novo. A esperança que o move. […]
Para manter a esperança de famílias estrangeiras no Brasil, projeto Empregadorismo conecta imigrantes a empresas interessadas em ampliar suas ações de diversidade
Imagine a seguinte situação: você precisa deixar a família e sair do seu país de origem para tentar uma vida melhor em outro lugar. Pessoas diferentes, idioma novo. A esperança que o move. Mas, chegando lá, o que você vive: fome, frio, dificuldades de se recolocar profissionalmente.
Essa é a saga de muitos imigrantes que chegam ao Brasil. Mudam os personagens, mas o roteiro do que parece história de cinema é praticamente o mesmo. Só que hoje vamos na contramão das estatísticas. A seguir, vamos conhecer uma história que mostra que existem, sim, maneiras de construir e de contribuir para finais mais felizes na jornada de quem busca uma vida nova.
Ao final do texto, um convite para quem passa pela situação ou para empresas que também gostariam de participar do movimento de mudança em prol de mais diversidade.
Da Venezuela para o Brasil
Yelitza Josefina Paredes, de 47 anos, chegou ao Brasil junto com o filho mais velho, Moisés, de 18 anos, em janeiro de 2018 como refugiada venezuelana. “Com a instabilidade política na Venezuela, a população mais pobre é diretamente atingida. Com isso, muitos, como eu, deixam o país em busca de oportunidades. Sou professora, mas, quando cheguei ao Brasil, trabalhei como empregada doméstica em condições análogas à escravidão”, revela.
Para entrar no Brasil pela fronteira de Pacaraima, em Roraima, Yelitza esperou autorização por três dias. “Éramos milhares de venezuelanos esperando permissão de entrada”, conta.
Sem ter para onde ir, ela e o filho passaram a morar nas ruas. “A língua foi o primeiro desespero. No primeiro dia, dormimos na Praça das Águas em Boa Vista. Lá, os bancos estavam proibidos de serem usados para dormir. Buscamos um lugar no chão junto a outros venezuelanos”, relembra o momento de dor.
Até chegar ao Rio de Janeiro, o final feliz de Yelitza parecia improvável, já que a professora viveu “momentos de terror”, como ela mesma descreve. Sem ter para onde ir, ela e o filho passaram fome e viveram sob condições de trabalho sub-humanas. Quando deixou seu país, acreditava que ficaria 90 dias fora. Entretanto, nunca mais voltou. E demorou longos 17 meses para ter a família completa ao seu lado.
Diversidade importa
Mas isso foi antes de ser acolhida pela Organização Internacional para as Migrações da ONU (OIM Brasil) e, posteriormente, receber uma oportunidade profissional na Associação Mawon. Hoje, Yelitza é uma das principais articuladoras comunitárias de refugiados venezuelanos no Brasil.
Seu talento em criar uma ampla rede de contatos – que atualmente conta com mais de 200 famílias de refugiados com origem na Venezuela – chamou a atenção da Associação, que enxergou em Yelitza o potencial de organizar as demandas dos imigrantes e, assim, conectá-los a empresas brasileiras. “Hoje, luto para que outros imigrantes não passem pelo que passei, tenham condições dignas de sobrevivência e ajudem as empresas a diversificar e enriquecer seus quadros de funcionários”, afirmou a articuladora.
Yelitza (de pé) conversando com outras mulheres imigrantes. (Crédito: Divulgação/Associação Mawon)
A fala de Yelitza vai ao encontro do relatório Why diversity matters, divulgado pela consultoria McKinsey, em 2019. O estudo aponta que empresas com estrangeiros em seu quadro de funcionários são 35% mais propensas a um maior retorno financeiro em relação a seus concorrentes na indústria nacional. A pesquisa revela ainda que a presença de um imigrante estimula a criação e amadurecimento da cultura de respeito, minimiza as chances de conflitos e de ocorrências dos casos de racismo entre os colaboradores.
“A inclusão de imigrantes no quadro de funcionários de uma empresa é um benefício tanto para os negócios, que se tornam mais diversos e ganham capital cultural, quanto para a sociedade, já que atua diretamente na diminuição da desigualdade social”, afirma Mélanie Montinard, co-fundadora da Mawon.
Incentivo à contratação de imigrantes nas empresas
No dia 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos, às 9h, a Associação Mawon realiza um evento online gratuito para apoiar imigrantes a conseguirem acessar o mercado de trabalho no Brasil. A ação faz parte da quarta edição do projeto Empregadorismo, que tem o apoio da Organização Internacional para as Migrações (OIM), a agência das Nações Unidas para as migrações, e da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID).
O objetivo do evento é fazer uma ponte entre empresas interessadas em ampliar a diversidade de seus funcionários e os 50 profissionais mapeados pela associação. Juliana Kaiser, professora de diversidade na PUC-Rio e UFRJ, ativista do antirracismo e especialista em Environmental, Social and Governance (ESG), que em português significa Ambiental, Social e Governança, abre a programação do evento falando sobre como a contratação de imigrantes e refugiados pelas empresas aumenta os indicadores sociais, de diversidade e de governança por melhorar a condição de vida e tirar essas pessoas do estado de vulnerabilidade. “Muitas empresas não sabem como fazer e neste encontro será apresentada a metodologia que inclui, entre outros pontos, a regularização desses imigrantes do Brasil”, explica.
Segundo Juliana, o que mais impede as empresas de contratar imigrantes e refugiados é o total desconhecimento da pauta: por um lado, não sabem onde localizar essas pessoas. Só no Brasil existem mais de 274 mil venezuelanos, por exemplo, que saíram de seu país em função da crise humanitária. “Muitos são qualificados, estão prontos para o mercado, porém não são achados pelas empresas. A ONG Mawon promove esse match oferecendo capacitação profissional para esses imigrantes e refugiados, e regularizando o status migratório”, reforça Juliana Kaiser.
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