Pouco conhecido no Brasil, o bordado realista é praticamente uma pintura com linha e agulha. Os movimentos cuidadosos e a combinação de cores formam um conjunto de imagens construídas à mão que expressam a vida no tecido. Animais, árvores e paisagens naturais facilmente saem do real e estampam espaços antes em branco. Para Ayeska Hübner, o caminho até o bordado foi tortuoso, com idas, vindas e rotas alternativas, mas, ainda assim, recompensador. Hoje, como artista e professora, compartilha seu trabalho com quase 100 mil seguidores em seu Instagram.
De formação, Ayeska é engenheira agrônoma, mestre e com um doutorado pela Universidade de São Paulo (USP). Depois de um período sanduíche na Austrália e a conclusão de sua tese, colocou na gaveta o tempo dedicado a graduação e pós-graduação e partiu em busca de finalmente encontrar um trabalho que desse sentido à vida.
Essa procura contou com um ano sabático, além de uma carreira inicial na fotografia. Mas Ayeska percebeu, novamente, que aquele não era o melhor caminho a ser trilhado. “Comecei a perceber que a fotografia também é um trabalho muito acelerado. Eu tinha que chegar à noite em casa, depois de um evento, e ainda editar as fotos para serem publicadas rapidamente”, explica.
Durante esse processo de redescoberta profissional, encontrou a foto de um bordado na rede social e, sem pensar, resolveu ir até um armarinho mais próximo de casa em busca de linhas e agulhas. Hoje, ela mora no Sul de Minas Gerais e, além de escritora, também oferece um curso com o passo a passo para aprender as técnicas do bordado realista.
Reencontro profissional com o bordado realista
Embora nem tudo precise fazer sentido, sua trajetória segue uma “costura” ao longo da vida. “Eu me formei em engenharia agronômica porque sempre gostei da natureza e quis um trabalho que tivesse essa relação”, explica Ayeska. Além desse interesse, sua dedicação a levou para a pós-graduação e perseguiu, por um bom tempo, o sonho de se tornar professora.
“Mas, quando eu defendi minha tese, eu pensei: ‘bom, eu já fiz tudo o que tinha que fazer, agora vou perseguir o que realmente eu quero”, explica. Sem um plano B, resolveu se inscrever em um curso de fotografia, venceu prêmios depois disso, mas aí vieram todas as reflexões que a fizeram deixar sua carreira acadêmica de lado: não estava plenamente feliz.
Foi ao “armarinho” mais próximo de sua casa em São Paulo, comprou linhas e agulhas, passou a bordar, mas sem tanta experiência. Apenas com o que o coração sentia. Decidiu comprar um livro em inglês que a ensinasse a bordar, seguiu o passo a passo e, logo depois, estava aceitando pequenas encomendas de amigos e familiares.
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Rótulos que perderam a validade
Em 2020, ela e o marido decidiram fazer uma viagem de fim de semana ao sítio que compraram no Sul de Minas. Na época, o lockdown havia se tornado a rotina em São Paulo, no início da pandemia, e os dois concordaram em não retornar naquele momento. “Ficamos aqui, com a roupa que a gente tinha, mas a crise sanitária não passou”, explica Ayeska.
“A sorte é que eu trouxe minhas coisas para bordar, mas ficamos até agosto de 2020 sem voltar para São Paulo”, acrescenta. Foi nesse período que suas atividades nas redes sociais ganharam proporções inimagináveis. As publicações cresceram e o número de novos seguidores aumentava a cada dia em sua conta @ah.bordadoamao. Assim, depois de vários pedidos, Ayeska decidiu oferecer aulas particulares e, com a grande procura, um curso. “Mas eu faço questão de mostrar o quanto tudo foi difícil, embora tenha feito sentido depois. Eu acabei me especializando no trabalho de ensinar as pessoas a bordarem e realizei o sonho de me tornar professora”, conta.
Por isso, na primeira aula de seu curso, antes de qualquer técnica, ela lembra de sua trajetória até ali. “Agrônoma, mestre, doutora, fotógrafa. Foi uma longa e difícil caminhada de autoconhecimento, mas depois que o bordado entrou na minha vida, todos esses rótulos deixaram de ser um peso para eu carregar”, explica no vídeo.
Novos voos
Hoje, Ayeska une sua experiência na agronomia e 0 contato junto à natureza para manter uma vida com mais significado no interior de Minas Gerais. Construiu um pequeno ateliê onde realiza seu trabalho e compartilha suas produções nas redes sociais. Além disso, ela também assumiu o desafio de escrever um livro com um passo a passo do bordado realista.
Sem nenhuma publicação deste tipo no Brasil, a obra será ilustrada por 36 elementos da fauna e flora dos seis biomas brasileiros e tem previsão de publicação para julho de 2024. Ayeska, agora, se organiza entre o trabalho, viagens pela América Latina para aprofundar suas técnicas e a vida no campo.
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