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Cabelos brancos em tempo de pandemia
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Mulheres de cabelos brancos são lindas, livres. Mulheres de cabelos prata são lunares, solares. Já as mulheres de cabelos prateados são joia, brilham. Mulheres carecas também. Com cabelos coberto, idem. Descobertos. Pretos. Loiros…

Eu não tenho cabelos brancos. Mas, tenho amigas que têm, já faz tempo. Minha reação lógica, sabendo da escravidão que é ter de pintar os cabelos a cada duas, três semanas, sempre foi pensar no “ainda-bem-que-ainda-não-tenho”, porque morro de preguiça de cabeleireiro.

Acontece que, de uns tempos pra cá, com a chegada da idade do meio, reparto o cabelo onde não costumava repartir e vejo o quanto meus fios brancos estão camuflados por mechas de castanho mais claro – ou loiro escuro, como meu cabelo é classificado. E fico pensando em quem tem que pintar nessa situação de #ficaemcasa e não sabe pra onde correr. Tem mesmo?

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Tem sido um dilema essa história de o que fazer com os cabelos brancos na pandemia, já que pintar em casa é osso, é duro chegar na cor, faz sujeira, e dali a duas, três semanas tem que fazer tudo de novo. Bons tempos pra isso também pensar: por que é que nos curvamos à tamanha ditadura?

Então quem é que disse que homem pode ser grisalho – e charmoso – e mulher não pode? O senso comum acusa que madeixas prateadas envelhecem, entristecem, dão a sensação de desleixo. Mas quem falou que é ruim envelhecer? Por que a cor do cabelo de uma mulher incomoda tanto as pessoas? Qual o problema em parecer a idade que se tem? Aliás, o que acabei de escrever é um enorme contrassenso. O culto ao padrão de beleza e ao rejuvenescimento como sinônimo de felicidade têm um poder inacreditável.

Envelhecer é vida

Meus cabelos brancos ainda estão mesclado com minha vasta cabeleira. Quando forem muitos, verei o que fazer com eles. Por enquanto ainda não sei. Mas sei que o assunto me interessa, no sentido de que ninguém tem nada a ver com isso. A gente age como se devesse explicação. Sobre o meu cabelo? Pra quem, mesmo?

Mulheres de cabelos brancos são lindas, livres. Mulheres de cabelos prata são lunares, solares. Já as mulheres de cabelos prateados são joia, brilham. As mulheres carecas também. Com cabelos coberto, idem. Descobertos. Pretos. Loiros. Pintados. Ruivos. Castanhos. Amendoados. Loiro escuro. Qualquer um. Todos.

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Embora ainda não tenha entrado nessa celeuma de digerir meus brancos e ver o que fazer com eles, se ponho em uso ou em desuso, sei que é só virar a esquina e esse dia chegará. Aí eu penso. Mas já sei que o ainda-bem-que-não-tenho é discurso deposto. Dentre os frívolos dilemas trazidos pela quarentena, este é um daqueles que levanta reflexões contundentes sobre os padrões e as liberdades. Mais do que cabelos brancos ou não, pensar sobre isso me interessa.

  • Tema abordado no documentário Branco & Prata, de Humberto Bassanelli e José Carlos Lage, com argumento de Elca Rubinstein (Brasil, 2017)
  • Onde ver: neste link aqui

Suzana Vidigal é tradutora, jornalista e cinéfila. Gosta de pensar que cada filme combina com um estado de espírito, mas gosta ainda mais de compartilhar com as pessoas a experiência que cada filme desperta na mente e na alma. Em 2009 criou o blog Cine Garimpo (www.cinegarimpo.com.br e @cinegarimpo) e traz, quinzenalmente, dicas de filmes pra saborear e refletir. 

*Os textos de nossos colunistas são de inteira responsabilidade dos mesmos e não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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