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Então deu tudo errado
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Viagens ajudam a curar feridas ou pequenas tristezas, mas não funcionam como fugas

Eu estava como queria: vivendo como nômade digital. Naquele momento, na Estônia. Antes, na Suíça. Mas certo pesar no peito me rondava há dias. Eu vinha mudando de país para me esquivar da sensação ruim, que mantinha escondida. Às vezes a gente usa a viagem como fuga. Coloca nela a esperança de que uma situação infeliz evapore.

Me desviei daquele sentimento indesejado, mas o monstro finalmente me alcançou caminhando na Pikk Tanäv, a rua mais antiga de Tallinn, capital da Estônia. Senti um esbarrão de algo invisível, que não se afastou. Foi me empurrando até a parede de pedras de uma casa medieval.

Fui apresentada ao pavor absoluto e um denso anseio de autodestruição me tomou. Em cinco dias, o monstro me arrastou para trás e vi minha vida rebobinar: ônibus, trens, voo de volta ao Brasil.

Só ao sobrevoar o Atlântico é que senti a estupidez de ter feito a escolha mais frustrante da minha vida. Ali, voltando, eu morria, enterrando junto meus sonhos de escritora-viajante. Por anos, lutei secretamente contra o desgosto da derrota. Um dia decidi guiar meus pais por uma longa viagem de reconhecimento da minha trajetória, até então não contada. Com os dois ao meu lado, a alegria genuína me reencontrou na praça central de Cracóvia (Polônia). Nesse dia voltei a sorrir com a alma. Eles me acompanharam até a Estônia, ao ponto onde esbarrei no pânico.

Enfrentei a lembrança e fiquei em paz.

A crise durante uma das mais lindas viagens da minha vida me roubou tempo e oportunidades? Sim, mas ganhei auto-conhecimento. Entrei nesse túnel para sair dele valorizando viagens como oportunidades de evolução – não como fugas. Viajar ajuda, mas os problemas vão com a gente.

O bom é que a cura vai também.


JULIANA REIS é uma viajante em busca de histórias, pessoas, lugares e experiências que a modifiquem. @viagenstransformadoras

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