Kankyo Tannier nos ensina a viver no aqui e agora
'Em busca do tempo presente' (Ed Sextante), novo livro da monja budista, é um manual simples para ter um dia a dia mais leve
- O que é o tempo presente?
- Viver o aqui e agora é uma dificuldade para muita gente. Como conseguir essa conexão numa sociedade que impõe cada vez mais a urgência?
- Acredita que a reclusão imposta pelo novo coronavírus ajudará com que a sociedade se aproxime mais do que realmente importa?
- As redes sociais ocupam parte significativa da vida das pessoas. De alguma forma isso pode ser prejudicial e por quê?
- O seu novo livro 'Em busca do tempo presente' tem várias dicas para que possamos nos encontrar com o momento presente. Mas uma mudança com várias etapas pode assustar quem não está acostumado. Quais os pontos principais para quem quer iniciar essa mudança?
‘Em busca do tempo presente’ (Ed Sextante), novo livro da monja budista, é um manual simples para ter um dia a dia mais leve
Eu nunca entendi bem o que é o tempo presente e como viver nele. Sou naturalmente ansioso, dessas pessoas que estão sempre com a cabeça no depois, e controlar essa característica, a fim de ter dias melhores e mais conectados com quem está ao meu redor e com as ações que faço, é uma tarefa que me demanda energia. Mas essa não é uma particularidade só minha. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, o Brasil é o país com mais pessoas ansiosas do mundo – mais de 9% da população convive com esse transtorno.
Como fincar os pés no aqui e agora? Essa é uma das muitas indagações feitas e respondidas com simplicidade pela monja budista Kankyo Tannier em seu novo livro, Em busca do tempo presente (Ed. Sextante).
Em bate-papo com Vida Simples, Tannier, que também é autora de A magia do silêncio, ensina a abrir espaços de calma e presença no dia a dia. Spoiler: um momento com você mesmo é uma chance de potencializar sua força.
O que é o tempo presente?
Você começa com a pergunta mais metafísica! 🙂 Direto ao ponto, bravo! O momento presente é uma vida em que estamos conectados às sensações do corpo. Uma vida onde realmente ouvimos, onde realmente cheiramos, onde realmente vemos o que está diante de nossos olhos. Viver o momento presente é saber exatamente o que acontece quando encontramos um olhar. E ousando vivê-lo. Em geral, tendemos a escapar constantemente do momento, refugiando-nos nos pensamentos. Resumindo: viver no momento presente é viver no corpo e não apenas na cabeça.
Viver o aqui e agora é uma dificuldade para muita gente. Como conseguir essa conexão numa sociedade que impõe cada vez mais a urgência?
A urgência, que parece imposta de fora, pode ser pacificada internamente. Por exemplo: qual sensação surge no coração com a necessidade de urgência? Pode ser estresse, ansiedade, sentimento de inadequação, medo do futuro, etc. São todas essas emoções negativas que geralmente tentamos evitar. O primeiro passo será enfrentar essa emoção de verdade, sem fugir, e perceber que é uma sensação física. Um nó no peito ou uma tensão na barriga, por exemplo. O segundo passo (um pouco mais difícil, é preciso treinar) será deixar essa emoção em paz, sem recusá-la nem mantê-la. É uma sensação que aparece e vai desaparecer. Com essa prática, a urgência fica muito mais suave, chegando a ser rara ou durar pouco tempo.
Acredita que a reclusão imposta pelo novo coronavírus ajudará com que a sociedade se aproxime mais do que realmente importa?
Aqui no meu mosteiro não saímos muito, temos uma vida muito simples, ligadas à natureza e as pessoas são radiantes! Não é uma vida fácil em comunidade para se estar entre à manhã e à noite, mas a meditação, a concentração e o humor nos ajudam a viver e progredir juntos. Meu desejo para o futuro é que cada vez mais a gente desista do supérfluo e encontre tempo para olhar o céu, contemplar as árvores, conversar profundamente com um amigo, cultivar a terra. É gratuito e, com isso, o tempo parece passar mais devagar.
As redes sociais ocupam parte significativa da vida das pessoas. De alguma forma isso pode ser prejudicial e por quê?
É ambivalente. Por um lado, essas redes nos permitem estar conectados com os amigos e a encontrar fontes alternativas de informação. Por outro lado, nos instalam em uma vida virtual, onde reinam os algoritmos. Essas redes são um formidável instrumento de manipulação mental, de hipnose coletiva, assim como a televisão já era, em menor medida, ditando o estilo de vida das famílias. Hoje temos a escolha: assistir ou não assistir, ou melhor, controlar seu consumo. Porque Instagram, Facebook e outras redes sociais mexem com o emocional e nos levam cegamente de um sentimento a outro, em alta velocidade. Depois de um tempo na internet, muitas vezes temos uma sensação de desconforto, de transbordamento, que será muito difícil esvaziar. Minha recomendação é simples: ouse viver sem esses gadgets, na incandescência do real.
O seu novo livro ‘Em busca do tempo presente’ tem várias dicas para que possamos nos encontrar com o momento presente. Mas uma mudança com várias etapas pode assustar quem não está acostumado. Quais os pontos principais para quem quer iniciar essa mudança?
Na verdade, propus muitos caminhos, muitos exercícios concretos. Mas não se trata de fazer tudo! O leitor poderá escolher aquele que mais fala com ele, que mais lhe interessa, de acordo com seus objetivos. Como meu mestre espiritual Olivier Reigen Wang-Genh freqüentemente repete: “Escolha pequenos esforços que você possa manter por muito tempo” (uma frase pronunciada com 50 anos de prática de meditação todas as manhãs ;-))
Para mim, a chave é sentar-me em silêncio, 10 minutos por dia, respirar e absorver o movimento dos pensamentos e emoções. Uma nova vida começa!
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