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A natureza é professora
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Uma árvore, uma flor, uma mata, não importa o tamanho. Observá-las sempre rende ótimos aprendizados sobre como lidar com os problemas do dia a dia

Grande, robusto, altivo, ele só dá o ar da graça de suas flores uma vez ao ano, entre agosto e setembro, parecendo querer anunciar o início da primavera. Todos os anos faço vigília e o espero florir: primeiro, ele perde todas as folhas durante o outono. Depois, quando chegamos ao meio do inverno, já vejo surgirem os primeiros sinais de vida, com seus galhos mudando de cor diante da secura da estação. Logo, quando ele começa realmente a florescer, a rua vai ficando mais bonita com toda aquela combinação de cores, de encher os olhos com tamanha beleza.

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Observar os ciclos pelos quais o ipê da minha rua passa até dar flor é também uma forma de aprender com sua delicadeza e sua força. Sempre tão sábia, em seus pequenos detalhes, a natureza diariamente nos ensina sobre a nossa vida, o passar do tempo, a capacidade de sentir e também sobre as etapas de nosso crescimento. “Quando paramos para prestar atenção ao que nos cerca, percebemos que nada acontece em vão. Quando muda um galho de lugar, por exemplo, uma árvore não está agindo em benefício próprio, mas sim por um bem comum”, me explicou Carol Freitas.

Natureza é travessia

Ela é designer, filósofa e se dedica aos estudos da biomimética, uma ciência que busca aprender estratégias e soluções com a natureza, para então trazer esse conhecimento para as diversas áreas da vida. Carol me contou que estabelecer um contato com a natureza é criar uma proximidade maior com a gente mesma. Isso porque, se olharmos mais de perto, vamos compreender que tudo está em sintonia, uma vez que não só as árvores e plantas fazem parte do meio ambiente, mas tudo que vive, respira, se move, inclusive nós mesmos. A todo tempo podemos aprender com a natureza e tornar o dia a dia mais leve, percebendo que nada acontece por acaso: tudo tem um fundamento, um porquê. E todas as soluções estão disponíveis para nós, só precisamos aprender a percebê-las. “Ela nos ensina que até mesmo uma folha que cai de uma árvore tem um motivo”, completou.

Se levamos esse aprendizado para a nossa vida, vamos entender também que, algumas vezes, aceitar o ciclo natural das coisas é a melhor forma de seguirmos em frente, sem tantas travas ou reclamações. Muitas vezes, durante a caminhada, não vamos compreender de imediato a razão de um determinado acontecimento que de repente nos surpreende. Mas, quando o acolhemos, percebemos que, assim como as folhas que caem das árvores, os obstáculos que surgem em nossa vida carregam aprendizados e sentidos. “A natureza nos mostra também que não é nunca só sobre resultados, mas sim sobre a travessia”, observou Carol.

Aprendizados diários

Para absorver esses pequenos, mas tão valiosos ensinamentos que a natureza nos traz e que nos relacionam à nossa verdadeira essência, é preciso ter olhos atentos e coração disposto para estabelecer uma reconexão entre nós e o meio ambiente. “A maneira mais fácil de aprendermos com a natureza é lembrar primeiro por que ela faz o que faz. Na biomimética, temos aquela máxima de que a vida cria condições que propiciam vida. Todo ser vivo está sempre evoluindo”, lembrou Carol.

Esse processo de compreensão muitas vezes consiste em uma tarefa delicada de observar tudo o que nos cerca: as árvores da rua em que moramos também têm histórias a contar e se comunicam umas com as outras; os raios de sol, que nos aquecem no inverno, fornecem luz, vitamina e calor necessários ao nosso corpo; as flores, que nascem no tempo certo em cada jardim, servem de alimento para insetos responsáveis pelo equilíbrio da flora. E assim por diante.

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Tudo está em perfeita sintonia. “Conforme eu fui estudando, fui tomando a consciência de que, se até um caracolzinho tem uma função, uma missão, e ele persiste, não desiste, eu também tinha a minha, e tinha que começar a olhar um pouco mais para isso”, explicou Carol. Assumir nosso papel diante da vida é uma das chances que temos de viver com mais certezas e menos desavenças, respeitando nossos limites, momentos e processos internos. Afinal, tudo tem o seu tempo. E, assim como na natureza todos os seres vivem em função de seus ciclos, ajudando uns aos outros, contribuindo a todo instante para a continuação da vida, também podemos e devemos partilhar o que carregamos de melhor para que todos os que estão à nossa volta recebam o nosso afeto e se sintam parte de nós.

Raízes e origens

Em seu livro A Vida Secreta das Árvores – o que elas Sentem e Como se Comunicam (Sextante), o escritor e pesquisador alemão Peter Wohlleben reforça essa ideia de comunidade e explica que, por suas raízes, as árvores estabelecem uma espécie de comunicação entre si, como uma rede de internet, em que tudo se conecta. Por ali, elas compartilham informações, se comunicam e se ajudam, fornecendo umas às outras força e nutrientes para que permaneçam de pé diante das situações mais adversas, sem abrir espaço para egoísmos ou individualidades, compreendendo que juntas elas são mais fortes.

Indo mais além e voltando esse olhar para nós, é fácil entender que também por nossas raízes, nossos vínculos e vivência com o outro é que nos identificamos como parte do mundo e do espaço em que vivemos: são as raízes, as nossas origens, que nos firmam ao chão e nos transmitem a realidade de onde e para o que viemos.

Cultivando delicadezas

É a partir dessas percepções que, aos poucos, vamos nos reconectando de verdade com a natureza, desenvolvendo a compreensão de como somos semelhantes e do quanto temos a aprender com ela. “É comum pensarmos em natureza como algo distinto de nós. Isso me soa estranho porque, se não somos natureza, somos o quê? Perceber-se como natureza é se religar à ancestralidade humana”, me disse o compositor Vitor Carvalho, que divide sua casa com mais 23 plantas. Segundo ele, cuidar desse pedaço de natureza é o mesmo que entrar em uma espécie de eixo com a vida. “A casa calma, com bastante verde e animais, funciona como um portal que atravesso todos os dias para vencer a hiperatividade de morar em uma metrópole.”

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Assim como o Vitor e sua família de plantas, podemos criar em nossos espaços uma atmosfera que propicie esse contato mais próximo com o meio ambiente. Carol Freitas me contou que o simples cultivo de uma planta já nos conecta um pouco mais com a nossa natureza interna e também com a externa. Acompanhar o crescimento
de uma muda desperta em nós a delicadeza do cuidado e a atenção para o desenvolvimento de cada ser. E aí é  mais fácil compreendermos essa importância de observar e perceber como a natureza faz parte de tudo. “Ter plantas em casa e observar os seus ciclos é um grande passo para que essa conexão com a natureza comece a acontecer. Aprender a quantidade de água a colocar, entender quando precisa de poda, criar uma proximidade com aquela planta”, me explicou Carol.

Perceba mais

Além disso, um passeio no parque, um mergulho breve nas águas do mar, dez minutos no banco da praça e ouvindo o canto dos pássaros: todas essas coisas pequeninas e que podem ser inseridas no dia a dia contribuem de uma forma simples no nosso processo de (re) conexão com a natureza. “Para quem está em cidades e não pode ir fazer uma trilha nem tem um parque por perto, uma boa atividade é começar a catalogar todas as árvores que estão em volta da sua casa e do trabalho”, indicou Carol.

Ela me disse também que, antes de se aprofundar em seus estudos de biomimética, andava em volta de sua casa, anotava as características de cada árvore e pesquisava para descobrir que espécie era. “A gente tem mania de olhar para uma árvore e pensar: ‘ah, é uma árvore’, e ponto. Mas que árvore é? Qual espécie? Por que está daquele jeito?”.

Tempo de florescer

Quando estamos abertos a ouvir, tocar e sentir, automaticamente também somos tocados e modificados por toda a beleza que nos cerca. Só aprendemos quando conhecemos algo se nos dispomos a vivenciar cada situação. Ou seja: todos esses sinais tão valiosos que a natureza traz para a nossa vida só vão efetivamente fazer algum sentido se nos abrirmos para modificar a nossa forma de perceber, sentir e olhar para tudo o que está ao redor. “Minha vida se divide entre educação, música e literatura. Ao dar aulas para crianças de 6 anos da zona sul do Rio de Janeiro, percebo que a preocupação delas com o planeta, em especial o meio ambiente e os animais, é frequente”, contou Vitor Carvalho. Nunca é tarde, no entanto, para, como escreveu Manoel de Barros, “aprender o idioma das árvores, saber as canções do vento”.

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Diminuir o ritmo e receber com delicadeza os ensinamentos e afagos que a natureza nos traz é também compreender nossos ciclos e abrir espaço para o nosso florescer, seja qual for a estação do ano.

➥ Para saber mais sobre o tema: http://bit.ly/BemEstarNatureza

Débora Gomes é apaixonada por ipês e pela cor de suas flores contrastando com os tons de azul do céu.

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