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‘Brain rot’: o que está por trás desse comportamento e como evitá-lo
(Foto: Unsplash) Imersos em telas, buscamos distração mas muitas vezes, encontramos espelhos do nosso próprio cansaço
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Você já se pegou vendo o vídeo de um tubarão dançando sem sentido nas redes sociais ou repetindo “bailarina cappuccina” por horas depois de assistir a uma trend repetitiva e aleatória? De repente, você passa por teorias da conspiração absurdas, vídeos acelerados de receitas, gente chorando ou dançando e nem percebe o tempo passar. No fim, está mentalmente exausto, mas sem saber explicar o porquê. Esse tipo de consumo faz parte de um fenômeno chamado brain rot” ou, em tradução livre, “apodrecimento cerebral”.

O termo, que surgiu de forma irônica nas redes, tem sido usado por jovens para descrever o efeito colateral de passar muito tempo rolando conteúdos rápidos, rasos e excessivamente estimulantes. Isso não é novidade para ninguém, mas sim a forma como os algoritmos, agora guiados por inteligência artificial, prendem cada vez mais nossa atenção. Elas entregam conteúdos cada vez mais viciantes, personalizados e instantâneos. É uma espécie de entretenimento sem pausa, feito sob medida para nos manter rolando a tela.

O que você consome também te consome

A fadiga mental provocada pelo uso excessivo de tecnologia não se manifesta apenas como cansaço. Ela vem disfarçada em sintomas que, muitas vezes, normalizamos. Entre eles, estão dificuldade de concentração, sensação constante de exaustão, ansiedade, irritabilidade, perda de memória e um bloqueio criativo que faz até tarefas simples parecerem pesadas. Segundo a psicanalista Elainne Ourives, o cérebro processa estímulos superficiais e não consegue relaxar de verdade mesmo em descanso. “É como se a mente fosse um canal de televisão sintonizado em várias estações ao mesmo tempo.”

O impacto de vídeos de baixa qualidade vai além do que se vê na tela. Eles alimentam emoções como comparação e desânimo, o que nos deixa presos em um ciclo de distração e superficialidade. Já os conteúdos que elevam nossa vibração, como reflexões profundas, arte, ciência e espiritualidade podem nos alinhar com sensações de propósito, clareza e criatividade.

“Tudo o que você consome se transforma em frequência vibracional. E essa frequência molda a realidade que você cocriará”, afirma Elainne. Ou seja: a escolha do que colocamos para dentro, mesmo que seja uma rolagem distraída de tela, tem impacto direto em como nos sentimos e vivemos. 

O impacto do ‘brain rot’ nas telas de crianças e adolescentes

Neuropsicóloga especialista em adolescência, Lilian Vendrame reforça que o ‘brain rot’ está diretamente relacionado ao consumo excessivo de conteúdos “dopaminérgicos” — aqueles que oferecem recompensas rápidas ao cérebro, como vídeos curtos, memes, desafios e estímulos visuais caóticos. Segundo Lilian, quando a criança ou pré-adolescente se acostuma apenas com esse tipo de estímulo, ela encontra dificuldade para sustentar a atenção em atividades que exigem foco prolongado, como estudar, conversar ou brincar de faz de conta.

“É como se o cérebro criasse apenas uma estrada asfaltada por onde gosta de passar sempre. As outras, mais difíceis, como a da criatividade ou da interação social, ficam abandonadas. A criança para de construir novas conexões neuronais.”

Alguns sinais indicam que o uso de telas já afeta o desenvolvimento da criança. O isolamento, a irritabilidade quando longe do celular ou do tablet, a desatenção na escola e a redução da imaginação espontânea são alguns deles. O sono também pode ser prejudicado, gerando um ciclo de cansaço, instabilidade emocional e menor capacidade de lidar com a vida real.

A neuropsicóloga alerta que esses efeitos não se limitam à infância: há uma geração de adolescentes e adultos afetados pela fragmentação do pensamento. “Com tanto conteúdo curto, a mente perde a capacidade de sustentar uma linha de raciocínio com começo, meio e fim. Muitos adolescentes não conseguem nomear o que sentem ou pensam, justamente porque não exercitam a construção de narrativas internas. Eles vivem pulando de estímulo em estímulo”, observa Lilian.

“Não adianta pedir para a criança largar o celular enquanto o adulto está rolando o feed das redes sociais. O cérebro dela está em desenvolvimento. Ela precisa de modelo, vocabulário emocional e incentivo à presença verdadeira”, diz.

A orientação não deve ser pela imposição, mas pela conexão. Usar expressões como “vamos descansar os olhos agora” ou “vamos fazer uma pausa para cuidar do nosso cérebro” pode ajudar a criar consciência e vínculo. Também é fundamental envolver a criança em combinados com alternativas ao tempo online.

Como evitar o ‘brain rot’ e ter mais presença na vida real

Desintoxicar o cérebro do excesso de telas não precisa ser um processo punitivo. Pelo contrário, deve ser uma construção de experiências prazerosas que estimulem outras vias cerebrais como o da atenção e curiosidade. Levantar os olhos da tela e observar o que está ao redor, brincar ao ar livre, imaginar histórias, criar jogos, cultivar relações afetivas e conversar com escuta ativa são caminhos possíveis.

Precisamos ajudar o cérebro a voltar a gostar da vida real e isso se faz em pequenas escolhas do cotidiano com disponibilidade emocional e, acima de tudo, cultivo da presença.

Combater o ‘brain rot’ não significa abandonar a tecnologia, mas usá-la com consciência. Elainne sugere práticas simples para prevenir esse esgotamento mental:

  • Estabelecer limites claros de tempo de tela, especialmente ao acordar e antes de dormir;
  • Fazer curas digitais com momentos sem notificações ou redes sociais;
  • Escolher conteúdos que inspirem, eduquem e acalmem;
  • Meditar, caminhar ao ar livre e ouvir músicas em frequências que promovam equilíbrio;
  • Praticar o silêncio como espaço de reconexão.

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