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Saber encontrar o riso, mesmo em situações difíceis ou aborrecidas, nos ajuda a seguir na vida com mais leveza

Tem dias em que a gente parece levantar da cama com o pé esquerdo. É o despertador que não toca. Ou o café que derrama, o pombo que caga na sua cabeça na entrada do metrô ou no ponto do ônibus, que (claro!) está lotado. Há aqueles que, diante do que parece ser um dia péssimo, o mais péssimo de todos, começam a rir da própria má sorte. Outros seguem remoendo o azar e puxam, do fundo do baú emocional, tudo o que não está caminhando muito bem na própria trajetória. O que nos coloca diante dessa mesma encruzilhada é apenas, acredite, um dia ruim. Todo mundo passa por isso de vez em quando. Mas o que faz com que alguns tirem de letra toda a situação e sigam com o humor inabalado e outros fiquem maldizendo a vida e contaminando todos ao redor?

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No livro Em Busca do Sentido – Um Psicólogo no Campo de Concentração (Vozes), o psiquiatra e neurologista austríaco Viktor Emil Frankl ensina sobre as escolhas baseadas na compreensão. Frankl passou boa parte da Segunda Guerra em um campo de concentração. Para não sofrer tanto diante das situações que não podia mudar, se apoiou na prática do bom humor como uma espécie de salvação. “Eu nunca teria conseguido suportar se não conseguisse rir”, conta. A partir de suas experiências, Frankl criou a logoterapia, uma teoria que utiliza o sentido do humor como um de seus principais recursos terapêuticos.

Vontade de humor

Para ele, essa disposição é uma forma de visão que revela a vida de uma maneira diferente, mesmo diante das contradições entre a expectativa e a realidade, tão normais hoje em dia. “O riso me levava momentaneamente para fora daquela situação horrível. Era o suficiente para torná-la suportável”, afirma em seu livro. Imagine se ele tivesse feito o contrário e se entregado ao sofrimento?

Frankl dizia ainda que “a própria vontade de humor” (ou a nossa tentativa de enxergar as coisas por uma perspectiva engraçada) é um truque útil para tornar mais leve a rotina. Mas acontece que nem sempre conseguimos isso. Muitas vezes, vidrados em nossas insatisfações e identificando apenas os problemas, esquecemos onde foi parar o bom humor e passamos pelos dias sem enxergar graça alguma.

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É aí que damos a largada para uma avalanche de ranzinzices. Perdemos a paciência com pequenas coisas (vale até mesmo um copo colocado na beirada de uma mesa). Brigamos no trânsito e praguejamos no trabalho, culpamos a nós e aos outros pelos nossos momentos ruins. “O sentido do humor é um desejo de entender ou aceitar a própria vida, ou seja, para perdoar, acolher e aceitar os desafios é preciso uma dose de humor genuíno”, observa o psicólogo e logoterapeuta paulista Francisco Carlos Gomes, que segue os princípios do austríaco Viktor Emil Frankl por aqui.

Francisco é também um dos fundadores do AgirTrês, um núcleo brasileiro de logoterapia que ajuda as pessoas a identificar a busca de sentido em sua vida e a força de motivação. “É através da expressão do humor que nos damos conta da nossa impotência, da nossa condição limitada, quando não percebemos que nada mais há a fazer e esse é o único remédio disponível”, observa.

Onde perdemos a nossa alegria?

Segundo Monja Coen, que segue a linha do zen-budismo e é missionária da tradição japonesa Soto Shu no Brasil, muito dessa falta de humor em que nos envolvemos está relacionada ao dukkha, um dos princípios fundamentais do
budismo e que significa sofrimento. O dukkha sugere que nada em nossa vida é permanente e por isso precisamos estar conscientes de que tudo está em constante mudança. Ou seja: as alegrias e as paixões são passageiras, assim como as dores e as aflições. Quando compreendemos essa temporalidade, saímos da nossa condição de agonia constante e entramos em um processo longo de aceitação. “Nada é fixo. Então por que reclamar tanto? Encontrar um estado de satisfação e contentamento com a existência é nosso dever e direito de nascença”, aconselha.

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Você não tem o poder de evitar os temporais de final de tarde ou acabar instantaneamente com as filas do banco, certo? Parar de praguejar tanto diante do que não se pode alterar, deixar de lado as reclamações sem fim, abandonar o estágio das queixas e dos lamentos abre espaço para que coisas boas entrem novamente na nossa vida e, como consequência, conseguimos reagir com mais equilíbrio – e menos reclamações – diante das dificuldades e chatices da rotina.

O trânsito pode até irritar mais que a fila na casa lotérica em quinto dia útil. Mas, quando nos condicionamos a reclamar menos e compreender mais, aos poucos nos desvencilhamos desse estado constante de insatisfação. E tudo volta a ser mais leve. “Buda dizia que quem conhece o contentamento e a satisfação é uma pessoa de grande sabedoria. Pode estar bem em qualquer situação”, nos lembra Monja Coen.

Imprevistos vão acontecer

Ok, na prática pode até parecer mais complexo encontrar esse estado de plenitude. Até porque estamos acostumados a encarar algumas adversidades com um olhar mais agressivo e menos compreensivo. E isso, na maioria das vezes, nos impede de reduzir o significado dos acontecimentos rotineiros, como transformar um tropeço na calçada em um “quase atropelamento” ou em uma tragédia pessoal – foi só o calçamento desigual que fez com que você pisasse em falso. Ao não superdimensionarmos um incidente como esse, conseguimos perceber seu significado ou tamanho real.

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No meio daquele trânsito que o atrasou, por exemplo, há um motorista esperando pelo guincho para levar o carro que quebrou – e causou toda a confusão. Era isso. Só isso. Ele não parou toda uma avenida de propósito e certamente também não está em um de seus melhores momentos. Entender isso não torna o dia melhor (nem pior), mas nos ajuda a treinar a tolerância e a perceber com mais clareza que uma mesma situação afeta diversas pessoas de formas diferentes.

Imprevistos vão acontecer e não há como fugir deles. Quando aceitamos isso, conseguimos lidar de uma forma mais gentil com as frustrações e as coisinhas desagradáveis que nos tiram o sossego, sem entrar no ciclo vicioso do vitimismo e da culpa. “Se não assumimos um estado egoísta, autocentrado, julgando e criticando o mundo, nosso emocional se torna mais leve e receptivo, mais compreensivo e cuidadoso com tudo o que existe”, diz Coen.

Assuma uma postura mais altruísta e generosa

Ao abrirmos o nosso olhar para a percepção e compreensão de tudo que nos rodeia, assumindo uma postura mais altruísta e generosa, entendemos que o fato de nossas vontades não prevalecerem não quer dizer que o mundo está contra nós. Porque ele realmente não está. Mas as situações que nos desagradam devem servir de aprendizado para que passemos a lidar com as pequenas frustrações com mais leveza. Assim, encarando-as como parte do nosso processo de crescimento e amadurecimento. E não como um complô ou uma armadilha do tempo.

Conhecendo o nosso interior

É importante dizer que todo esse processo de ação e reação está diretamente ligado a nos conhecermos melhor. Somente quando isso acontece e reconhecemos nossos maiores medos e algumas de nossas frustrações, somos  capazes de identificar o que nos tira do sério. E, a partir disso, encontrar um meio-termo ou uma forma mais gentil de encarar as eventualidades. “Quanto maior o autoconhecimento, mais estratégias cada um terá para lidar com os obstáculos que encontrar”, considera a psicóloga de Belo Horizonte Luisa Guimarães.

Atingir esse estágio de amadurecimento e de consciência de nós mesmos não é tão complexo quanto parece, mas devemos nos lembrar também que toda mudança demanda tempo e persistência. Quando ela está relacionada diretamente às nossas percepções e costumes, os processos tendem a ser ainda mais lentos e, por isso, precisamos ter consciência de que podemos e vamos falhar em diversos momentos. E que isso é normal. “Há que se ter cuidado para que essa luta contra o mau humor não acabe deixando-o ainda mais frustrado e, quem sabe, ainda mais mal-humorado”, considera Luisa.

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Por isso, é tão importante que cada um encontre estratégias para driblar as desavenças. Embora os contratempos aconteçam e atinjam a todos em proporções diferentes, só nós mesmos sabemos o que podemos suportar e como fazer isso. Utilizando os momentos chatos para algo mais produtivo, conseguimos neutralizar o estresse cotidiano e vislumbrar um caminho além do que nos incomoda. Assim, rir de nossas falhas se torna algo mais possível e próximo.

Pessoas felizes geralmente tratam bem

Quando encontramos esse equilíbrio entre o que nos desagrada e o que nos engrandece internamente, descobrimos uma forma de nos divertirmos com as pequenas graças da rotina (um tropeço na rua pode ser engraçado), espalhamos bom humor e contagiamos até os mais ranzinzas que estão por perto. Nossas ações são capazes de iluminar e clarear qualquer dia cinza que ameace tirar nosso brilho e perspectiva de positividade. E isso é, sem dúvidas, gratificante. “Nem sempre as pessoas nos tratam bem. Estaria esse ser com alguma necessidade não atendida? Pessoas felizes, que se sentem completas, que amam e são amadas, geralmente tratam bem as outras pessoas”, observa Monja Coen.

No entanto, quando há carência dessa harmonia e olhar mais negativo diante da vida, nos tornamos rudes, desagradáveis e também atingimos quem está ao redor, ofertando a nossa pior parte. Criamos, assim, uma espécie de vírus do mau humor, que rapidamente se espalha pelo ambiente à nossa volta. Por isso, Monja Coen nos lembra de algo importante: é preciso nos aproximarmos de quem nos ajuda a seguir pelo caminho do bem. “Boas companhias são as que nos fazem refletir e apreciar cada instante da vida.” Cuidando das nossas atitudes e sentimentos, nos tornamos automaticamente pessoas mais agradáveis de ter por perto, mesmo nos dias mais difíceis e cinzentos.

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A escolha pelo riso

Embora muitas vezes a escolha não seja o suficiente para determinar os nossos dias de bom humor, ela já é um grande e importante passo da nossa caminhada. Podemos optar por respirar fundo diante de algo que nos irrita e, assim, controlar um pouco as próprias reações diante do que incomoda. Quando é genuíno, o bom humor nos traz atitudes e pensamentos positivos. “A pessoa se sente mais motivada, mais capaz, mais disposta inclusive fisicamente e com mais vontade de viver”, analisa Luisa Guimarães. Quem cultiva o riso também tem um risco menor de se autossabotar e de se prender a sentimentos negativos como a raiva, o rancor, o ódio e a angústia, assumindo uma postura e atitude mais leve e harmoniosa.

Há mais de duas décadas, o paulista Rodrigo Robleño experimenta o poder da terapia do riso nos palcos e no dia a dia. Como o palhaço Viralata, personagem que veste para fazer estripulias em seus espetáculos, o ator e diretor circense cumpre a missão de fazer o outro gargalhar, além de provocar e chacoalhar as certezas, as verdades e questionar algumas regras que muitas vezes nos impomos. No entanto, quando está fora dos palcos, encarando a vida como uma pessoa comum, nem ele está a salvo dos contratempos, e já se viu, algumas vezes, na corda bamba, entre os altos e baixos do humor. “Isso acontece até mesmo como palhaço, apesar de que o Viralata é bem mais alegre do que eu”, explica Robleño.

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O perdão das armadilhas do acaso

Rodrigo Robleño, que já trabalhou em grandes espetáculos com o Cirque Du Soleil, é também escoteiro e tem como lema a seguinte máxima: “Somos alegres e sorrimos nas dificuldades”. Assim, ele encara os dias acreditando que
tudo pode ter um lado risível e que se divertir com cada situação é a chave para driblar os obstáculos e não deixar o “sorriso cair”. “Como palhaço, eu tento rir de tudo. Se a gente exercitar isso e colocar um sorriso no rosto a cada problema, rapidamente nosso humor nos ajudará a vencer todos eles”, considera.

Assumindo uma postura mais aberta e menos agressiva fica mais fácil perdoar todas as armadilhas do acaso e lidar com as falhas. “A gente tem que entender que não é tudo a ferro e fogo. E que a maioria das coisas que pensamos ser ‘o fim do mundo’ não o são”, avalia Luisa.

Divirta-se com cada situação

Em um de seus livros, o escritor britânico de origem irlandesa Oscar Wilde nos diz que “a vida é muito importante para ser levada a sério”. E nem precisamos pensar muito para concluir que levá-la de forma divertida é muito mais fácil e gostoso. Embora os momentos ruins estejam presentes no cotidiano mais do que gostaríamos, é bom lembrar que eles também não acontecem para todos ao mesmo tempo. Isso, por si só, já é capaz de tornar o mundo um pouco mais leve e engraçado. Mesmo depois de uma série de adversidades.

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Se nos dedicarmos a cultivar bons sentimentos, nos lembrarmos de respirar fundo e de perdoar a nós mesmos por nossos rompantes e falhas, vamos enxergar que o intolerável pode se transformar em algo mais aceitável e menos pesaroso. “Não é estar rindo o tempo todo, mas encontrar um estado de tranquilidade serena”, aconselha Monja Coen. Devemos aprender a aceitar que só porque as coisas não aconteceram como esperávamos não quer dizer que está tudo acabado. Muito menos que os próximos acontecimentos também serão frustrantes.

O importante, mesmo diante desses obstáculos, é que nunca deixemos de nos fazer questionamentos simples como: “Onde foi parar o meu bom humor? Onde foi que perdi a capacidade de rir da vida?”. Ou: “Por que me irritar com isso se tudo é passageiro?”. Que a gente aprenda a ser mais tolerante e gentil com nossas imperfeições e nossas falhas. Afinal, clichê ou não, rir é e sempre será o melhor remédio.

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Débora Gomes é otimista desde criança. E encontra no bom humor uma das chaves para lidar com as adversidades dos dias, sem deixar de sorrir

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