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Você abriu mão da sua intimidade?
Georgia de Lotz | Unsplash
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Não é sobre certo ou errado, é sobre uma escolha consciente de quem tem acesso ao nosso espaço privado e desfruta de informações sensíveis da nossa vida.

Era a primeira vez que eu ia falar com aquela pessoa depois de mais de um ano. Sim, contatos frequentes viraram conhecidos distantes no intervalo de uma pandemia. Assuntos de trabalho resolvidos, hora de um papo de café, mesmo que virtual. Foi aí que aproveitei para também saber como anda a vida de outras pessoas conhecidas.

– Como está sua amiga que estava com você quando nos encontramos da última vez?

– Não vejo há muito tempo, se mudou para o interior, começou uma plantação de orgânicos lá e está até vendendo alguns artesanatos também.

– E aquela outra pessoa, sabe dela?

– Ah, sim ela se mudou para fora do país.

– E aquele seu ex-colega de trabalho, tem notícias dele?

– Teve uma filhinha linda, fez aniversário esses dias. Ah, ele também comprou um carro e estava na praia.

As informações eram tão precisas e por vezes com tantos detalhes que acabei comentando como ela conseguiu se manter em contato com as pessoas durante todo esse período. No entanto, a resposta foi negativa.

– Não mantive contato. Estou te contando o que vi no Instagram.

Entretanto, não me surpreende, mas me impressiona muito o paradoxo da distância-intimidade. Você pode estar muito afastado de uma pessoa, tanto física quanto socialmente, no entanto, pode continuar desfrutando de uma grande intimidade. Basta seguir o que ela posta em suas redes sociais. Aliás, o filósofo Byung-Chul Han defende que num mundo digital nem se pode falar mais em distanciamento. E sem ele, caminhamos para perder o que considerarmos espaços de intimidade.

intimidade

Crédito: Austin Distel | Unsplash

Uma questão de segurança digital

Poderíamos aprofundar em questões de segurança, destacando como a abundância de detalhes das nossas vidas em canais digitais facilitam o trabalho de quem aplica golpes virtuais. Ou ainda de quem vigia nossos passos a fim de cometer crimes ainda piores. O assunto é importante e merece atenção.

Mas aqui quero te convidar a refletir sobre o espaço sagrado que pertence apenas a nós mesmos e aqueles que merecem nossa confiança. Sagrado não com conotações religiosas, mas ligado a origem da palavra, relativo a dedicação. Onde as pessoas de fato se dedicam umas as outras, sendo dignas de acompanhar pontos sensíveis e íntimos de nossas vidas.

A eliminação do respeito

De acordo com Byung-Chul Han, em seu livro No Enxame (Editora Vozes),  uma das consequências dessa privacidade à distância é a eliminação do respeito. O que leva à situações como a relatada por uma outra colega de trabalho, que recebeu uma mensagem numa rede social com opiniões sobre sua vida privada, mesmo que ela não as tivesse solicitado e nem tivesse dado nenhuma abertura para isso.

Tem quem queira se expor e levar uma vida em que público e privado não se separam. Precisamos entender o risco e saber que, ainda assim, estamos no nosso direito. Está lá, garantido no principio da dignidade humana protegido pelo art1º, inciso III da Constituição Federal e o direito à vida artigo 5º:

São invioláveis a intimidade, a vida privada, honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. 

Assim como, é seu direito também — por mais que o mundo diga o contrário — guardar sua intimidade apenas para você e para as pessoas nas quais confia. Está tudo bem não se expor nas redes sociais. Não contar onde almoçou, passou férias ou que perrengue passou. Assim como na vida, o mais importante na vida digital é que nossas escolhas sejam conscientes.


TIAGO BELOTTE é fundador e curador de conhecimento no CoolHow – laboratório de educação corporativa que auxilia pessoas e negócios a se conectarem com as novas habilidades da Nova Economia. É também professor de pesquisa e análise de tendências na PUC Minas  e no Uni-BH. Seu Instagram é @tiago_belotte. Escreve nesta coluna semanalmente, aos sábados.

*Os textos de nossos colunistas são de inteira responsabilidade dos mesmos e não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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