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Um lugar de fala
Jurien Huggins | Unsplash
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Mesmo que não pareça ou que muita gente ignore, as coisas têm um lugar. As pessoas também. E fora do seu lugar, coisas e pessoas perdem a forma e a função. Ficam deslocadas. Mas agora, aparece uma nova dimensão para a palavra lugar. Não mais no espaço e sim no tempo.

Lugar é uma palavra forte. É forte porque, apesar de possuir vários significados, nenhum deles exige muita explicação. Se a mãe diz aos filhos “…coloque as roupas no seu lugar”, eles irão entender o que isto significa. Dando um rolê na noite, um dos participantes de um grupo de jovens comenta “…acho melhor irmos para outro lugar”, e todos vão entender a mensagem, mesmo que não concordem com ela. O colaborador está em busca de algo novo e diz para o chefe que está buscando “um lugar melhor na empresa”.

Por não precisar de muita explicação, é bem fácil descobrir quando algo ou alguém está fora de lugar. Localizado em uma posição que não devia. Ocupando uma função que não lhe compete. Incorporado em uma forma que não lhe cai bem.

Fora de lugar

Estar no lugar certo pode até passar despercebido. E estar fora do lugar, depois de um tempo pode até começar a incomodar. Coisas fora do lugar mais cedo ou mais tarde chamam a atenção. Pessoas fora do lugar chamam ainda mais a atenção.

É claro que poderíamos entrar em uma discussão interminável sobre qual o lugar adequado para coisas e pessoas e, com certeza, iríamos encontrar uma quantidade igualmente interminável de opiniões que, no final, não iriam permitir saber qual o melhor lugar de muita coisa e de muita gente. Sem contar que estar em um lugar não é sinônimo de estar no lugar certo assim como estar fora de lugar também não significa estar no lugar errado. 

lugar de fala

Crédito: Clem Onojeghuo | Unsplash

Um lugar para a voz

Foi a filósofa, feminista negra e escritora Djamila Ribeiro que chamou a atenção para e necessidade de trazer as pessoas a lugares onde sua mensagem pudesse ser ouvida e entendida.

Esse lugar se contrapõe a uma hierarquia estruturada da sociedade, onde as produções intelectuais, o conhecimento e as manifestações de grupos de pessoas sejam tratados de modo inferior. Desta forma, o lugar ocupado por essas pessoas acaba sendo um lugar silencioso e seus ocupantes estão sempre silenciados.

Lugar de fala

Em um livro lançado em 2017, muito propriamente intitulado “O que é lugar de fala”, Djamila Ribeiro percorre uma retrospectiva histórica para identificar vozes que foram tradicionalmente emudecidas. Essa retrospectiva encaminha a resposta um tanto óbvia à questão “quem tem mais chances de falar e ser ouvido na sociedade ?”

lugar de fala

Crédito: Edward Howell | Unsplash

É a criação de lugares sociais que criem um contraponto prático e efetivo ao lugar silenciado, que surge o lugar de fala. Um lugar que dá visibilidade, atenção e consideração a pensamentos nunca ouvidos e menos ainda entendidos durante muito tempo na história. Claro que o conceito de pertinência a esse grupo dá aos seus membros o lugar de fala imediato e legítimo.

O entendimento e absorção deste novo lugar, o lugar de fala, evoca outras considerações igualmente importantes. Como por exemplo, a necessidade de uma escuta silenciosa de todos enquanto alguém ocupa seu lugar de fala.

Entenda o seu lugar

O que antes poderia parecer apenas uma localização no espaço ou uma ocupação na pirâmide social, passa agora a ser um momento de legítima ocupação para exercer a oportunidade de se comunicar.

A palavra lugar, que antes remetia diretamente ao conceito de espaço, passa agora a relacionar também com tempo. O tempo em que você pode se comunicar falando ou apenas praticando a escuta silenciosa. Esse bem poderá ser o seu lugar de fala. E se for, você não será um incômodo.


Fábio Gandour é formado em Medicina e dedicou-se à pesquisa científica, mas sempre manteve uma atitude de observador social. Como tal, procura valorizar aspectos que moldam a sociedade moderna, como a inclusão e igualdade de oportunidades.

*Os textos de nossos colunistas são de inteira responsabilidade dos mesmos e não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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