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Qual a relação entre as masculinidades e a crise climática?
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Para lidar com a crise climática, nós, homens, temos que aprender a escutar, a conhecer outras formas de estar no mundo e a abrir mão de nossos privilégios para dividir o poder com mulheres e com povos que vivem em harmonia com o meio ambiente.

Estão cada vez mais intensas as consequências ambientais da forma como a maior parte da sociedade humana se organizou nos últimos séculos. No século 21, é inegável que vivemos uma emergência climática. Diversas espécies de plantas e animais já correm risco de extinção. No entanto, apesar do aquecimento global tornar a vida pior para todas as pessoas humanas e não-humanas, é preciso dizer que não sofreremos as consequências na mesma medida.

Mulheres têm maior potencial de serem afetadas pelas alterações que ocorrerão do que os homens, já que, por exemplo, segundo a ONU, as mulheres são 80% das pessoas obrigadas atualmente a deixar seus lares e se refugiarem por conta das catástrofes. Além disso, povos tradicionais, indígenas, quilombolas e comunidades ribeirinhas têm seus modos de vida ameaçados pela destruição de áreas naturais. Sem falar, ainda, que a população negra no Brasil é maioria entre os mais pobres e estão mais vulneráveis em eventos climáticos extremos.

E o que isso tem a ver com as masculinidades? Tudo.

Somos nós homens, especialmente brancos e cisgêneros, que majoritariamente pensamos e construímos as bases de como a nossa sociedade está estruturada. Fora isso, os homens ocupam os principais postos de poder, seja em âmbito governamental ou empresarial.

Portanto, se o ser humano está causando uma mudança no clima do planeta, os homens com certeza são os principais responsáveis.

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Os padrões masculinos

Um dos motivos de eu querer me aprofundar nas questões envolvendo masculinidades foi o de perceber que ela está relacionada aos diversos desafios que enfrentamos social e ambientalmente, como diz Ismael dos Anjos no documentário “O Silêncio dos Homens”.

Por conta da pressão por performar a masculinidade hegemônica, que já abordamos em outros textos aqui na coluna, os homens tendem a ver a preservação do meio ambiente como uma “coisa de mulher”. O ato é percebido como uma atividade de cuidado, historicamente associada ao feminino, conforme a conclusão de uma pesquisa realizada nos Estados Unidos, em 2019.

Também há pesquisas que mostram como os homens consomem mais carne do que mulheres. Sabe-se que uma redução nesse consumo diminuiria os impactos sobre o meio ambiente. Eu noto o desejo desse consumo em mim quando lembro de propagandas de hambúrgueres e de carnes que associavam o consumo de carne à força física e à virilidade.

Grande parte da minha socialização como jovem foi em churrascos com amigos e família em que havia grande consumo de carne e álcool. Deixar de consumir carne nesses espaços, além de exigir uma desconstrução pessoal, requer a sustentação de sua decisão perante os questionamentos dos demais homens. Sem falar, claro, na dificuldade de providenciar outros alimentos para substituição.

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Cultura da destruição

Nós, homens, somos muitas vezes incentivados a sermos desbravadores e dominadores. Nossa cultura prega a necessidade de termos e precisarmos de mais. Não é à toa que utilizamos o termo “virgem” para nos referirmos a florestas em que não houve nossa interferência.

Como afirma Eliane Brum, em seu último livro Banzeiro òkòtó, não superaremos o maior desafio da trajetória humana até agora, a emergência climática, se não mudarmos nossa matriz de pensamento.

Nessa busca, fiz minha terceira viagem à Amazônia, onde pude presenciar como indígenas e ribeirinhos interagem com o ambiente de forma a garantir sua preservação e seu florescimento.

Aprendi muito com duas mulheres que fazem parte da liderança de suas comunidades, Adriana Siqueira, da Comunidade ribeirinha Santa Helena do Inglês, e Alzenira Yanomami, cacica em comunidade indígena localizada no município de Novo Airão, no Amazonas.

Se quisermos fazer parte da solução, nós homens temos que aprender a escutar, conhecer outras formas de estar no mundo e abrir mão de nossos privilégios para dividir o poder com mulheres e com povos que vivem em harmonia com o meio ambiente.

Talvez, assim, consigamos garantir que os seres humanos sigam habitando esta nossa casa coletiva. No caminho, ainda poderemos descobrir como nos tornarmos homens que, de fato, contribuem para o futuro da humanidade.

Leia todos os textos da coluna Brotherhood em Vida Simples.


LUIZ EDUARDO ALCANTARA (@lendalcantara), atua na área da justiça, é um dos guardiões do Brotherhood Brasil (@brotherhoodbrasil) e um curioso sobre os papéis dos homens na sociedade.

*Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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