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Será o fim dos restaurantes vegetarianos?
kayleigh harrington / Unsplash
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André Mafra reflete sobre o futuro dos restaurantes vegetarianos. Para o colunista, há uma “tendência que marca uma expansão muito positiva da oferta de uma grande variedade de opções de pratos sem carnes em muitos restaurantes”.


Tempos de ares progressistas parecem soprar mais fortes no horizonte alimentar, nossa comida deve ganhar contornos éticos inéditos e potencialmente transformadores.

Rafael Tonon, em seu livro “As revoluções da comida”

Tema polêmico tanto quanto futebol e religião, falar de escolhas alimentares torna-se em dias atuais um grande desafio. Com emocionalidades, à parte convido o leitor a uma reflexão advinda de minha última viagem.

Faz um tempo que observo um interessante fenômeno, um aumento gigantesco de um público que opta por diminuir ou cortar de vez o consumo de carnes em sua dieta. Segundo a Ipsos estamos falando de 41% da população brasileira que considera comer menos carne para ajudar a reverter os efeitos de mudança climática por exemplo. Para além da escolha pessoal de refino alimentar, em tempos complexos como os de hoje, temos que somar o triste acréscimo daqueles que “escolheram” a redução por não ter como comprar, mas este é outro tema, para outro momento.

Vegetarianos em todos os lugares

Com o aumento da demanda em opções em carnes, vejo uma interessante demanda surgir no mercado chamado de “normal” ou seja, em restaurantes não rotulados de vegetariano no qual seus menus cada vez mais estão recheados de opções sem carnes, muitas vezes destacados em seções especiais ou sinalizadas com um desenho de um folhinha verde ao lado do nome do prato.

Será o fim dos restaurantes exclusivamente vegetarianos? E a resposta é um triplo sim.

Estive faz poucas semanas em viagem por três capitais europeias, Lisboa em Portugal, Helsinki na Finlândia e Tallinn na Estônia. Além de serem três cidades espetaculares, as opções gastronômicas me chamaram a atenção, pois em quase todos os restaurantes que visitamos havia muitas opções sem carnes e de refinado sabor e apresentação. Ter na carta diversas opções para os mais diversos paladares torna-se mandatório na nova tendência de consumo nos restaurantes e bares, quem ainda não percebeu vai ficar para trás.

Entre os muitos exemplos quero destacar um que ocorreu na capital finlandesa, onde encontrei um restaurante que estava para minha felicidade à 3 minutos da minha hospedagem. Ao entrar com um grupo de amigos para verificar a possibilidade de uma mesa, fui surpreendido por uma introdução rápida feita por aquele que parecia ser o gerente da casa, na qual fomos avisados que naquele local os pratos eram feitos sem carnes. Não havia sinalização na porta do restaurante ou na internet de que se tratava de um restaurante vegetariano, o fato é que se houvesse eu não teria ido.

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Opções vegetarianas

Entenda que construímos uma imagem de que quando se alardeia que a comida é vegetariana, em geral a refeição será menos requintada ou saborosa, e de fato muito vezes pode não agradar ao paladar. Você pode argumentar que conhece um bom restaurante vegetariano que serve bons pratos, mas na minha percepção a comida feita para ser vegetariana perde de longe para as opções pinçadas de cardápios de restaurantes comuns.

Outro detalhe que corrobora com o a posição da alimentação alardeada como vegetariana é quando buscamos um bom local para refeição noturna. Em geral vegetarianos não estão abertos para o jantar onde claramente prioriza-se uma refeição de melhor porte. Ninguém pede o companheiro ou companheira me casamento em um almoço não é mesmo?

De volta a Helsinki, fiz as minhas escolas e me surpreendi com a explosão de sabores que vieram em minha boca. Provei sticks de queijo halloumi (uma variedade feita da mistura queijo de ovelha e de cabra, as vezes de vaca também) servido com molho de iogurte, amoras e kumquat (também chamada de laranjinha kinkan), simplesmente divino. Pedi também um baba ghanoush (mantive a grafia do cardápio), um tipo de pasta de berinjela defumada com hortelã e amêndoas torradas. Logo após chegou um risoto de aspargos condimentado um toque de limão e melissa decorado com flores comestíveis (pansy flower). Suave nas combinações e com tempo de cozimento impecável. Para finalizar, uma mousse de chocolate preto acrescido de amendoim arejado por um sorbet de ruibarbo. Sem palavras.

O que era para ser um jantar corriqueiro, ganhou status de banquete. Quanto sabor, quanto carinho e competência para apresentar aquelas iguarias. Ao final o estabelecimento nem precisaria avisar que o menu casa não servia carnes de espécie alguma, muitos em vários países que conheci nãos servem carnes e nem avisam, afinal se for boa a comida, nem sente-se a falta. No fim o que atrapalha é o rótulo.

Quer outro exemplo? As companhias aéreas sempre tiveram como opção a possibilidade de requisitar refeições vegetarianas aos passageiros em seus voos, desde que o pedido seja feito com antecedência e no final sempre decepcionavam pela falta de sabor. Para contemplar a crescente onda que clama por opções sem carne, em geral uma das duas opções sugeridas normalmente já são preparadas sem carnes. No seu próximo voo, observe.

Mas, afinal, qual será o futuro dos restaurantes vegetarianos?

Sim, sim, sim: eles tendem a acabar caso não se reinventem.

Ou se tornam super nichados, como os veganos, crudívoros entre outros – no primeiro caso onde não se coloca nada de origem animal e, no segundo, com todos os pratos servidos sem cozimento -, ou serão varridos pela onda de forte inserção de pratos com opções sem carnes nos restaurantes tradicionais.

Foto de um resurante com luzes arredondadas, cadeiras e uma mesa. Há um balcão no lado direito com um som e uma estante com vinhos. Do lado esquerdo há uma mesa e cadeiras, além de um quadro na parede.

Interior do restaurante Yes, yes, yes em Helsinki, Finlândia. Foto: Arquivo pessoal / André Mafra.

Mas, o restaurante citado por você, não era vegetariano?

Pois é. Era, mas não alardeava. Tratava-se de um ambiente disfarçado de restaurante tradicional. Boa música, decoração agradável, ótima apresentação dos pratos e excelente sabor. Neste caso para eles, a palavra vegetariano ou qualquer outro rótulo só trataria um olha antipatizado por muitos que torceriam o nariz para comidas sem carnes. O rótulo é o que estraga e tende a ser evitado no futuro.

Minha argumentação aqui nesta coluna não é para você adotar ou não este ou aquele sistema alimentar, mas sim observar uma tendência de mercado. Por mais que tenha minhas convicções particulares que permeiam minhas escolhas, abomino os juízes de prato alheio. Não tem coisa mais chata do que alguém vir reafirmar suas fracas convicções muitas vezes recém adotadas para outrem. Nada contra os apreciadores dos restaurantes que se estruturaram com a mensagem explícita de não ter carnes, de ser vegetariano, mas o que enxergo é tendência que marca uma expansão muito positiva da oferta de uma grande variedade de opções de pratos sem carnes em muitos restaurantes. Bom para o paladar, bom para o mundo.

Viva bem, experimente novos sabores e procure conhecer novos destinos. Que nunca sua opção alimentar seja fonte de intolerância nem daquele que a desfruta nem do que observa. Compartilhe comigo nos comentários as muitas opções sem carnes de ótima qualidade que você encontrou por aí.

Leia todos os artigos de André Mafra em Vida Simples.


ANDRÉ MAFRA (@prof_andremafra) é autor do livro “Sabores e Destinos: uma viagem pela história das especiarias”. Na obra, faz uma imersão no universo dos condimentos, ervas e temperos – e, por consequência, nos primórdios da cultura e das próprias relações humanas.

*Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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